quarta-feira, 24 de março de 2010

Nem a Primeira e Nem a Última


Colocou o vestido preto, os óculos escuros e chegou cedo. Postou-se ao lado do caixão. Não conseguiu chorar nem se emocionar. Na hora da cerimônia ouviu quieta o que disse o padre que abençoou o cadáver. Acompanhou o cortejo até o túmulo. Recebeu de todos os votos de pêsames. Já exausta pegou o taxi e foi para casa. Tomou um longo banho e colocou o roupão. Era preciso arrumar,  limpar, colocar no lixo: o prato de sopa, a colher e, sobretudo, o tempero discreto e forte que derruba até cavalo.

11 comentários:

  1. Rapaz, e ninguém desconfiou?
    Ótimo miniconto!

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  2. Janaina, segundo as estatísticas ocultas - jamais reveladas porque perigosa para a harmonia da sociedade - essa é uma forma que muitas pessoas encontram para se acabar, de forma definitiva, com as crises dos relacionamentos. Depois é só chamar o médico da família e dizer que ele teve um treco ou um troço e o atestado de óbito sai na hora.

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  3. Pelo menos ela não foi ao cinema. Se ela fosse esperta mesmo, mataria de fome, não deixaria vestígio algum. Mas tem que ser muito esperta e paciente para conseguir isso.

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  4. Por isso que o meu pretinho básico está sempre limpo e passado. A gente nunca sabe quando é que vai precisar usar.

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