sábado, 31 de março de 2012

Tênues rabiscos







Eram vestes antigas
trapos rotos, imprestáveis
inodoras.
Palavras repetidas passadas
de boca em boca
por mãos mais hábeis
mais criativas.
Hoje tornaram-se linhas
tênues rabiscos imperceptíveis
a olho nu.




Do escuro é que ela gosta
do silêncio do fundo
do poço sem corda.
Um fio entrelaçado
um corte na garganta
no cordão umbilical...
Um grito rouco, o choro...



No polegar a veia que salta:
nas mãos encruzilhada névoa
palavras desarticuladas, desconexas
falam por todos os poros.
Balbucio de vozes a entoar
um discurso estranhamente familiar.

Murilo Mendes

Murilograma a Graciliano Ramos

1

Brabo. Olhofaca. Difícil.
Cacto já se humanizando,

Deriva de um solo sáfaro
Que não junta, antes retira,

Desacontece, desquer.

2

Funda o estilo à sua imagem:
Na tábua seca do livro

Nenhuma voluta inútil.
Rejeita qualquer lirismo.

Tachando a flor de feroz.

3

Tem desejos amarelos.
Quer amar, o sol ulula,

Leva o homem do deserto
(Graciliano-Fabiano)

Ao limite irrespirável.

4

Em dimensão de grandeza
Onde o conforto é vacante,

Seu passo trágico escreve
A épica real do BR

Que desintegrado explode.

sexta-feira, 30 de março de 2012

Viagem até a Noite





Como uma mãe sustentada por galhos fluviais
de espanto e de luz de origem
Como um cavalo esquelético,
radiante de luz crepuscular
Atrás a ramagem densa de árvores
e árvores de angústia
Cheio de sol o caminho de estrelas marinhas
o estoque fulgurante de dados perdidos
na noite cabal do passado
Como um ofegar eterno se sai à noite
Ao vento tranquilo passam os javalis,
as hienas fartas de rapina
Rompido ao largo o espetáculo mostra
faces sangrentas de eclipse lunar
O corpo em labareda oscila pelo tempo
sem espaço cambiante pois o eterno
é o imóvel e todas as pedras arrojadas
ao vendaval aos quatro pontos cardeais
voltam como pássaros solitários
devorando lagoas de anos derruídos
Insondáveis teias de aranha de tempo
caído e lenhoso
Vacuidades enferrujadas no silêncio piramidal
Morticínio pestanejante esplendor
para dizer-me que ainda vivo
respondendo por cada poro de meu corpo
ao poderio de teu nome, oh poesia !

César Moro, pseudônimo de Alfredo Quispez Asin, poeta e pintor peruano, nascido em Lima. Participou ao lado de André Breton do movimento surrealista em Paris e é considerado um dos principais representantes do surrealismo hispano-americano (1903-1956)

quinta-feira, 29 de março de 2012

Um poema de Jorge Luís Borges





Poema dos dons


Ninguém rebaixe a lágrima ou rejeite
Esta declaração da maestria
De Deus, que com magnífica ironia
Deu-me a um só tempo os livros e a noite.

Da cidade de livros tornou donos
Estes olhos sem luz, que só concedem
Em ler entre as bibliotecas dos sonhos
Insensatos parágrafos que cedem

As alvas a seu afã. em vão o dia
Prodiga-lhes seus livros infinitos,
Árduos como os árduos manuscritos
Que pereceram em Alexandria.

De fome e de sede (narra uma história grega)
Morre um rei entre fontes e jardins;
Eu fatigo sem rumo os confins
Dessa alta e funda biblioteca cega.

Enciclopédias, altas, o Oriente
E o Ocidente, centúrias, dinastias,
Símbolos, cosmos e cosmogonias
Brindam as paredes, mas inutilmente.

Em minha sombra, o oco breu com desvelo
Investigo, o bácuo indeciso,
Eu, que me figurava o Paraíso
Tendo uma biblioteca por modelo.

Algo, que por certo não se vislumbra
No termo acaso, rege, estas coisas;
Outro já recebeu em outras nebulosas
Tardes os muitos livros e a penumbra.

Ao errar pelas lentas galerias
Sinto às vezes com vago horror sagrado
Que sou o outro, o morto, habituado
Aos mesmos passos e nos mesmos dias.

Qual de nós dois escreve este poema
De uma só sombra e de um eu plural?
O nome que me assina é essencial,
Se é indiviso e uno esse anátema?

Groussac ou Borges, olho este querido
Mundo que se deforma e que se apaga
Numa empalidecida cinza vaga
Que se parece ao sonho e ao olvido.

quarta-feira, 28 de março de 2012

Segredos...!

"La Boca de la Veritá"


Existem nas recordações de todo homem, coisas que ele só revela aos amigos. Há outras que não revela, mesmo aos amigos, apenas a si mesmo e assim mesmo em segredo. Mas também há, finalmente, coisas que o homem tem medo de desvendar até a si próprio.


Fiódor Dostoievski, escritor russo (1821-1881), autor de "Crime e Castigo", "Recordações da Casa dos Mortos", "O Idiota", "Os Irmãos Karamazov", entre muitos outros.

Ademilde Fonseca - 1921-2012


Bom-dia, Sol! Bom-dia...



Coração Noturno

(Raul Seixas)

Amanhece, amanhece, amanhece,
amanhece, amanhece o dia
Um leve toque de poesia
Com a certeza que a luz
que se derrama
nos traga um pouco, um pouco, um pouco de alegria !
A frieza do relógio
não compete com a quentura do meu coração
Coração que bate 4 por 4
sem lógica, sem lógica e sem nenhuma razão
Bom dia sol !!!
Bom dia, dia !
Olha a fonte, olha os montes
Horizonte
Olha a luz que enxovalha e guia
A Lua se oferece ao dia
E eu, E eu guardo cada pedacinho de mim
prá mim mesmo
Rindo louco, louco, mais louco de euforia
Bom dia sol !!!
Bom dia, dia !
Eu e o coração
Companheiros de absurdos no noturno
no soturno
No entanto, entretanto
e portanto ...
Bom dia sol !!!
Bom dia, sol !

segunda-feira, 26 de março de 2012

Mar Amarelo






Senta-te no trabalho
imputrescível. E olha:
as coisas amarelas. Nas
árvores, faltam folhas.
Nas solidões, medidas.


Teu irmão com câncer
na garganta, de chinelos.


Crianças ouvindo o mar
em conchas, envolvidas.


E o telegrama que não vem.
E o telegrama que não vem.
E o telegrama.


Frutífera é a cor que chega
como seta [como lança], vinda
do mar-de-antes [além de ouvida
concha].


O mar real que faz barulho e
salga.


O mar onde brincamos com os
vizinhos [te lembras disso?!],
com os pés molhados.


O mar transfigurado em
poça [ou poça em mar],
derramado ao chão [sem
sal], em jarros d’água.


Nossa sala de estar.


[Brincadeira de
criança].


Lembra-te das
Infâncias. O Mar
[também] ouvido
em concha.



Mas não amarelo,
como agora.

Marcelo Novaes

Adeus, Tabucchi




Antonio Tabucchi (1943-2012)morreu ontem, domingo, em Lisboa.

sábado, 24 de março de 2012

E então...?

Despalavreada


A despalavreada língua do silêncio
desempedra as sílabas
com que me engasgo em
sons redondos feito balas
enquanto chove
pelo o meu interior
o seu copo
ladrão de
nuvens.

Tentativa e erro/acerto... ou Teimosia e erro?

A vida é feita de tentativas, erros e acertos. Na teoria, se não tentarmos, não acertaremos. E deveria funcionar assim mesmo.


Isso se o ser humano não funcionasse de um modo tão complicado, tão estranho. Não fosse, ele mesmo, seu maior carrasco.


Sim, porque a vida é nossa maior sala de aula. Aprendemos a cada dia coisas novas e temos condições de assimilar comportamentos, culturas, situações e tantas coisas que vemos na rua, mesmo fora de cursos e faculdades. Cabe a nós, filtrarmos o que temos a nossa disposição, aproveitando e transformando em algo mais. E aí, voltar ao ponto da tentativa e erro.


Quanto mais tentarmos, praticarmos, mais acertaremos. Certo? Nem sempre. Nosso cérebro, essa coisa complicada, complexa e misteriosa, que está no topo do nosso corpo, é muito mais inteligente e danado do que quem ele coordena. E ele adora pregar peças. A maior delas? Ele nos ensina algumas coisas rapidamente, mas não deixa isso tão claro assim. Não tem legendas, nem diz que algo está arquivado. Depende da nossa percepção, do nosso “feeling” e dos nossos filtros, para captar aquilo que esta ali. E ele permite algo chamado “auto-engano” com frequência. Nós, seres humanos teimosos que somos, insistimos em repetir comportamentos e situações por pura teimosia.


Pois é. Teimosia. Aquilo que nos faz saber que algo que fizemos 5 vezes de um jeito, não pode ter resultado diferente se feito igual. Não se trata de continuar praticando, afinal, já deu errado (e ainda assim, repetimos). Essa insistência a que chamamos, tão inadequadamente, de persistência (sem percebermos a diferença) é algo que nos leva a resultados iguais e ruins. Então, continuamos errando, e nos dizendo que vamos conseguir: Ah, uma hora vai dar certo.


E assim, escolhemos pessoas erradas. Escolhemos trabalhos errados. Escolhemos amigos errados. E até casas, viagens e roupas. Na verdade, escolhemos uma vida inteira cheia de frustações, simplesmente por que tentamos viver um conceito que não é aquele que precisamos, mas aquele que insistimos em ter. Acreditamos viver de tentativas e erros para conseguir acertar, enquanto na verdade, estamos apenas sendo mais teimosos conosco, do que merecemos.


Estamos teimando em viver algo que já vimos que não vai dar certo, ao invés de permitir que os tantos acertos que foram registros, criem um novo arquivo, e nos dfeixem reprogramar as coisas, só um pouquinho...

quinta-feira, 22 de março de 2012

Vicente Huidobro



VICENTE HUIDOBRO (1893-1947) — Chileno. Dos maiores poetas da América. Instituiu o Criacionismo. Em Paris desde 1916, escreveu em francês parte de sua obra. Alguns títulos: Horizon Carré (1917), Tour Eiffel, Hallalí (1918), Saisons Choisies (1921), Automne Regulier (1925), Altazor (1931).


ARTE POETICA

Que el verso sea como una llave
Que abra mil puertas.
Una hoja cae; algo pasa volando;
Cuanto miren los ojos creado sea,
Y el alma del oyente quede temblando.

Inventa mundos nuevos y cuida tu palavra;
El adjetivo, cuando no da vida, mata.

Estamos en el ciclo de los nervios.
El músculo cuelga,
Como recuerdo, en los museos;
Mas no por eso tenemos menos fuerza:
El vigor verdadero
Reside en la cabeza.

Por qué cantáis la rosa, ¡oh, Poetas!
Hacedla florecer en el poema;

Sólo para nosotros
Viven las cosas bajo el sol.

El Poeta es un pequeño dios.

ARTE POÉTICA

Que o verso seja como uma chave
Que abra mil portas.
Uma folha cai; algo passa voando;
Quanto fitem os olhos criado seja,
E a alma de quem ouve fique tremendo.

Inventa mundos novos e cultiva a palavra;
O adjetivo, quando não dá vida, mata.

Estamos no ciclo dos nervos.
O músculo pende,
Como lembrança, nos museus;
Mas nem por isso temos menos força:
O vigor verdadeiro
Reside na cabeça.

Por que cantais a rosa, ó Poetas!
Fazei-a florescer no poema.

Somente para nós
Vivem as coisas sob o sol.

O Poeta é um pequeno deus.


Tradução de Anderson Braga Horta.
Extraído do Portal de Antonio Miranda.

probabilidades # 1

.


em busca do alinhar do poema, também, pelo registo da imagem...

quarta-feira, 21 de março de 2012

Soneto das metamorfoses

Carolina, a cansada, fez-se espera

e nunca se entregou ao mar antigo.

Não por temor ao mar, mas ao perigo

de com ela incendiar-se a primavera.

Carolina, a cansada que então era,

despiu humildemente as vestes pretas

e incendiou navios e corvetas

já cansada, por fim, de tanta espera.

E cinza fez-se. E teve o corpo implume

escandalosamente penetrado

de imprevistos azuis e claro lume.

Foi quando, se lembrou de ser esquife:

abandonou seu corpo incendiado

e adormeceu nas brumas do Recife.


Carlos Pena Filho, Recife(PE) - 1929-1960

Entrevista com Nelson Rodrigues


Nelson Rodrigues prefere falar de Amor e Morte

Revista do Rádio 09/11/1963

Nazareh Resende


-Onde nasceu?

Em Recife, Pernambuco, a rua João Ramos.

-Qual o nome de seus pais?

Mário Rodrigues e Maria Inês

-Qual o juízo que faz de si próprio?

Eu sou um triste.

-Você é o que é por vocação, por imposição de alguém ou da vida?

Vocação.

-Qual outra profissão gostaria de ter?

Gostaria de ser um marinheiro de Eugene O`Neil.

-O melhor conselho é de quem?

O meu amigo Otto Lara Resende arranjou um lugar no conselho fiscal de uma empresa. Esta é o único conselho útil.

-Qual a pessoa mais interessante que você conheceu?

O poeta psicanalista Hélio Pelegrino.

-Qual a melhor recordação?

O mar de Olinda.

-Qual a sua filosofia?

Não gosto de pensar.

-Você é combativo ou fatalista?

Tudo que acontece já estava predeterminado há milênios.

-Quer apontar suas maiores qualidades?

Uma certa vontade de ser bom.

-Você acha que têm defeitos, quais?

Tenho a maior ternura pelos meus defeitos.

-Há coisas que você se arrependa de não ter feito?

Vivo me arrependendo.

-Que notícia lhe agradaria por em uma manchete de jornal?

O fim de um mundo que já fracassou.

-Tem algum desejo irrealizável?

Cada um de nós é um pouco de Napoleão de hospício.

-Quais os tipos de pessoa que você gosta lhe dar?

Os pobres diabos.

-Qual o maior invento humano?

O aperto de mão.

-Existe um objetivo especial que você procura atingir?

A morte.

-Gosta do silêncio?

Não.

-Você dá importância à moda?

Qualquer moda é cômica.

-Que faz quando lhe sobra algum tempo?

Faço a única coisa eu gosto realmente de fazer, nada.

-Como reage quando na imprensa aparecem escritos que você considera injusto?

Eu desagrado os imbecis de ambos os sexos.

-Como define o escândalo?

É tudo que irrita os cretinos.

-Qual o assunto de sua preferência?

Amor e morte.

-Confidencialmente: você resiste a um elogio?

O elogio me envergonha e degrada.

-O seu temperamento é tempestuoso ou calmo?

Sou bovino.

-Dentre as coisas materiais que o pertence, de que você gosta mais?

Uma cadeira de balanço, de palhinha.

-Para você, como deve ser o amigo perfeito?

Fiel na vida e na morte.

-Alguém na sua família também é famoso?

Meu pai era famosíssimo. Meus irmãos, Roberto Rodrigues e Mário Filho. Todos meus irmãos são brilhantíssimos.

-O amor tem grande significado em sua vida?

Só o amor existe.

-É a favor do divórcio?

Sou.

-O que mais admira na mulher?

A capacidade de morrer de amor.

-A mulher moderna é melhor que a antiga, tem defeitos?

Pouco feminina.

-O perfume é a arma feminina?

O perfume é abominável, o que interessa é o cheiro natural da mulher.

-Como define a mulher charmante?

Uma pobre diaba.

-Quais os escritores de que mais admira?

Dostoievski.

-Cite um filósofo que mais se adapte a sua personalidade?

Nenhum.

-Há uma música que lhe traga grandes vigências. Qual?

A valsa Conde de Luxemburgo marca toda minha infância.

-Compositores?

Tenho uma sensibilidade musical ordinaríssima.

-Qual filme que ficou em sua sensibilidade?

O cinema continua sendo a arte não criada.

-Que realmente significa para você a popularidade?

Humilhação.

-O que faria você para que o próximo natal fosse mais feliz?

Todo natal é triste.

-O que está faltando ao Brasil?

O Brasil não tem elite.

-Qual a receita para conseguir a felicidade?

Estar só.

-Alguma pergunta que não foi feita e que você gostaria de ter respondido?

Se o amor é eterno.

terça-feira, 20 de março de 2012

"Os Cantos de Maldoror" (Trecho)




Ó ser humano! eis-te agora, nu como um verme, diante do meu gládio de diamante! Abandona teu método; passou o tempo de te fingires orgulhoso; lanço sobre ti minha oração, em atitude prosternada. Alguém observa os mínimos movimentos de tua vida criminosa; estás envolvido pelas malhas sutis da sua perspicácia encarniçada. Não confies nele quando vira as rédeas, pois te encara; não confies nele quando fecha os olhos, pois ainda te encara. É difícil supor que, por meio de artimanhas e maldades, tua temível resolução tenha sido ultrapassar o fruto de minha imaginação. Mesmo seus golpes mais fracos têm efeito. Com cuidado, é possível ensinar àqueles que fingem ignorá-lo que lobos e salteadores não se devoram mutuamente; talvez não seja hábito.

Isidore Ducasse ou Conde de Lautréamont, (1846-1870) nascido em Montevidéu, considerado o grande poeta maldito da segunda metade do século XIX, junto com o seu contemporâneo Arthur Rimbaud.

segunda-feira, 19 de março de 2012

"Tenho que tirar sangue do olho e forjar a fogo minha própria carne para que o cotidiano, enfim, faça-se poesia."

Entrevista com o poeta Domingos Barroso



http://domingosbarroso.blogspot.com.br/


O Bruxo das Letras

 Poeta de corpo,
coisas,
carinhos;

Poeta de alma,
armas,
andorinhas;

Poeta de palmas,
pégasus,
pergaminhos;

Poeta de eras,
ermos,
escrivaninhas;

Poeta de marcas,
melancolias,
marinhos;

Poeta de faces,
fundos,
formiguinhas;

Poeta de reinos,
rasgos,
redemoinhos;

Poeta de botas,
brumas,
bainhas;

Poeta de dobras,
deixas,
descaminhos;

Poeta de peso,
penas,
pracinhas;

Poeta de sarcasmo,
sonhos,
sapinhos;

Poeta de escarro,
epifanias,
entrelinhas;

Enfim, poeta espantoso,
tão lúcido, quão louco,
eis Domingos Barroso!


(Cris de Souza)


RV - Beijinho de fã, poeta dos dias (primeiro um chamego)... tua voz orienta minha atenção às coisas singelas, mas tão permeadas de poesia, que nos cercam sem fazerem alarde... e me declaro formiguinha a trilhar pelo meio de teus versos, caladinha quase sempre, mais preocupada em me abastecer de teu originalíssimo lirismo a manifestar a maravilhosa impressão que ele me causa. Noto teus olhos tão tristes e há traços de melancolia em teu versejar, apesar de disfarçada por uma sutil irreverência (ou ironia). Afinal, que sentimentos (ou sensações) mais te acompanham ao escrever... e o que costuma despertá-los? (Joelma Bittencourt)
DB – “Não sou alegre nem sou triste sou poeta”, belíssimo verso de Cecília Meireles. Mas o poeta que sou não é esse hiato, esse interlúdio, esse vácuo entre a alegria e a tristeza. Sou de fato um poeta triste, e a ironia que me salva é apenas o cinismo da própria tristeza. Quando escrevo o único sentimento que me envolve é um sentimento de plenitude e de vertigem [mesmo que nada exista a ser despertado dentro ou fora de mim].
RV - Sou fascinada pela presença das formiguinhas em teus poemas... tanto, que já me ocorreu uma pergunta maluca durante uma das várias leituras em que elas apareceram, líricas... Responde para nós: se as formiguinhas fossem providas de fala, o que gostarias que elas te confessassem sobre Domingos Barroso? (Joelma Bittencourt)
DB – Diriam elas - “Domingos Barroso, às vezes tu nos irritas com tanto realismo fantástico... sai do quarto, rapaz, sê um guerreiro mongol montado no seu intrépido cavalo e o vento a queimar teu rosto... salva-te!”
RV - Meu caro Domingos, o quanto do cotidiano precisa respirar para se inspirar? (Celso Mendes)
DB – Toda a minha poesia é o meu cotidiano [do que está presente ou do que me foi na alma marcado]; e como todo cotidiano poético é um mundo surreal à parte, vejo por necessidade não apenas respirá-lo mas sobretudo com ele trocar de pele. A inspiração é um trabalho constante entre suspirar e morrer sob a ebulição das ideias. Tenho que tirar sangue, muito sangue do olho, e forjar a fogo minha própria carne para que o cotidiano, enfim, faça-se poesia.

RV - O que um Lacaio da Poesia deve saber do feitiço das palavras? (Celso Mendes)

DB – Que as palavras [depois de lançadas ao campo de girassóis] têm mil cores, mil céus e mil mundos imaginários. E que seja humilde o serviçal e saiba despedir-se das palavras quando o vento levá-las além das suas costelas. O silêncio é a outra face do feitiço das palavras: um frio tremendo que rói até mesmo os ossos de uma suntuosa baleia.
RV - Domingos como acontece o seu processo de criação e em que medida a blogosfera influencia ela hoje? (Sandrio Cândido)
DB – O meu processo de criação ocorre quando, primeiro, percebo que o meu olhar se converte [fica um olhar meio dormente, suspenso, absorto e perdido], em seguida o meu coração começa a bater tambor [ora furioso, ora dócil]; não há espaço miraculoso nem clima favorável; escrevo com o que tiver na mão [lápis, teclado, pena de águia, giz de cera, carvão, máquina de escrever Olivetti Stúdio 45]; e se eu estiver dormindo, ou caminhando pelas calçadas molhadas da chuva fina de ontem , então acabo confabulando com os meus fantasmas e peço-lhes que escrevam nas paredes da minha cabeça enquanto acordo ou chego em casa. Por vezes sou abençoado pela cumplicidade poética estabelecida na blogosfera. Curioso que há almas parceiras que mesmo após a remoção dos seus blogs permanecem admiráveis, a maravilhosa poeta Lara Amaral é um exemplo. Embora seu Teatro da Vida não mais exista aos olhos dos meros mortais viajantes, sinto sua poesia viva e febril.
RV - Domingos a poesia hoje parece ter deixado de ser exclusiva dos livros, afinal porque poesia é um gênero a ser trabalhado por você e será que a poesia está condenado a morrer em nossa sociedade do espetáculo? (Sandrio Cândido)
DB – A poesia tem o seu próprio recanto - um deserto florido na alma do poeta, e não importa a sociedade [se uma sociedade espumante ou miserável]; o poeta antes dos livros escrevia nas cavernas e nos marfins dos mamutes e o fogo descoberto não lhe causou tanto espanto, uma vez que dentro da sua alma há outra chama tão impressionante quanto antiga.
RV - Qual será o seu epitáfio? (Sandrio Cândido)
DB – “Saibam os vermes que comem a minha carne que não é carne o que devoram mas nuvens de céus distantes...”
RV - Você adentra o poema e caminha seguro até o final? Ou dá os primeiros passos e logo perde o chão, deixando-se levar por ele? Ou nem isso: já tira os pés antes mesmo de nele entrar? (Wilden Barreiro)
DB – Eu pego o poema pelas mãos, a questão é que as minhas mãos tremem e os dedos começam a dançar ciranda. Aproveito esse embalo e respiro o poema ausente de mim - é nesse momento, sob extrema lucidez poética, que entendo uma coisa: o poeta é o moinho das suas próprias águas.
RV - Um cantinho, um violão... uma estante, um Pessoa...  lençóis de cetim, uma deusa....uma mesa, papel e lápis. Qual dessas opções sua alma escolhe? Ou ela, ambiciosa e insaciável, se esquarteja e arrebanha todas? (Wilden Barreiro)
DB – Dá-me então apenas uma deusa para que ela esprema as espinhas das minhas costas e fique acordada até tardão da noite ouvindo minhas loucuras e tolices. Depois eu faria amor com essa deusa e seria pai de duendes e fadinhas.

RV – “Estou a envelhecer, meu bem/ mas ainda espero entrar pela janela/ o teu perfume nem que seja no bico/ de uma andorinha velhinha e sapeca.” Esta estrofe final do segundo poema postado no Lacaio da Poesia apresenta a seus leitores um dos personagens mais assíduos na sua poesia: a andorinha. Assíduos são também as formiguinhas, as xícaras, os travesseiros, as babies, os pombos (sempre de tênis Nike) e... o bermudão!  Por quê, Domingos? Bruxos vestem bermudão para melhor apreciar o rebolado das babies, das formiguinhas, das andorinhas, dos pombos, das xícaras e dos travesseiros? (Tuca Zamagna)
DB – Na verdade o que os bruxos gostam é de ficar nus no quarto à espera das andorinhas que adentram pela janela do banheiro. A xícara... ah, minha xícara... ultimamente não me encanta - as duas fissuras que formavam um sorriso na sua circunferência estão totalmente desfiguradas. Os travesseiros são os únicos fantasmas que posso esgoelar e lançar contra as paredes. As ninfas um sonho libidinoso e a cada dia mais neurótico. Os pombos continuam com seus tênis Nike pedindo esmolas e atacando os olhos das rosas dos canteiros das praças. Quanto ao bermudão preciso pô-lo de molho, anda triste dentro do cesto de roupa suja.
RV –  “Se durmo bem,/ meus travesseiros não dormem.”... “Tenho flores para cheirar, mel para beber/ e abelhas para ferroar meu rosto.”... “Minha cabana é logo adiante/ seguindo o chiclete das minhas botas”... “Os pombos quando envelhecem/ tropeçam nos cadarços/ dos seus tênis Nike/ desbotados.”... “Sempre assim,/ no instante do idílio/ caem dos céus andorinhas/ infartadas”... “Minha alma é puro ciúme/ do invisível que lambe”.... “Minha alma só deixa meu corpo/ por um motivo: coçar minhas costas.”... 
O humor, em geral surrealista, é o que mais me encanta na sua poesia. Mesmo quando a graça não é explícita, pode-se ver a todo instante a sombra sonsa do seu sorriso. Você é um cara sempre humorado, do tipo que ou leva as pessoas a sufocarem de tanto rir quando está de bom humor ou a subirem pelas paredes e pularem de cabeça do teto quando está de mau humor? (Tuca Zamagna)
DB – Em companhia das pessoas sou apenas um lunático. Decerto muitas delas já tentaram pular sobre meu pescoço e torcê-lo de tanto tédio e outras até sorriram com historinhas que conto de bem-te-vis flertando minhocas, dividindo sorvete e tomando banho de sol... A sombra sonsa do meu sorriso: é a mais pura verdade, seja escrevendo versos, sonhando ou com artrite. A sombra sonso do meu sorriso é eterna e creio que até morto, só a caveira, ainda estará lá a sombra sonsa do meu sorriso.
RV – “Eu amo suas panturrilhas/ como nunca amei uma alma.” O poema “Dançarina” é todo ele exaltação a essa parte anatômica mágica do corpo feminino. Para mim (e estou certo de que para você também), elas, por si sós, justificam o uso e abuso dos vestidos e até a criminalização do uso da calça comprida pelas mulheres. Sinceramente, sua libido consegue distinguir uma mulher de pernas radicalmente desbatatadas de, por exemplo, uma saracura, uma siriema, uma avestruz? (Tuca Zamagna)
DB – Cresci vendo mulheres subindo ladeiras com latas d’água na cabeça. As panturrilhas, batatas das pernas, são todo o encanto da minha alma concupiscente.

RV - Conte um pouco sobre como começou a escrever. O que te deu aquele click da escrita nas veias? (Luiza Maciel)
DB – Dentro da barriga da minha mãe era uma dificuldade escrever. A água da placenta apagava tudo que eu escrevia. Então jurei a mim mesmo que logo que viesse ao mundo trataria de escrever feito um louco e ofereceria minha alma como gratidão.  “Confesso Que Vivi” do poeta Pablo Neruda foi um atestado de loucura e de lirismo [e eu era uma criança]; passei dias chorando e suplicando aos céus que durante toda a minha vida nunca fugisse de mim aquele encanto. Eu não imaginava em que abismo estava a me meter - um abismo terrível e deleitoso.
RV -É evidente, na poesia, seu poder de sobreviver às mudanças da sociedade, sua capacidade de reinventar-se e manter-se em vigor poético ao longo dos séculos, isso é o que podemos constatar com o crescimento, cada vez maior, dos blogs desse gênero, portanto, eu gostaria de saber: No seu entendimento, a internet banaliza ou favorece a difusão e produção da linguagem poética? (Iracema)
DB – Penso que não importa o tempo e os meios [se versos escritos à sombra dos dedos ou diretamente no tablet de última geração] - a banalização da poesia é responsabilidade exclusiva de quem escreve versos ruins [mas como sabê-los se não escrevê-los?]; um Quintana ou um Fernando Pessoa são eternos porque seus versos são assombrosamente bons. E permaneceriam, ainda que esquecidos dentro de uma gaveta. Do alto número de blogs de poesia atenta-me em muitos deles apenas uma ponte de vaidade e de anseio doentio por seguidores e comentários. Ao criar o Lacaio da Poesia também passei por essa morbidez e tive que me tratar seriamente - passei um longo período escrevendo à luz de lampião e só mostrando meus versos para minhas botas. Particularmente, vivo apagando poemas [ok, sei que é psicose poética] quando encontro alguma falha, como uma palavra deslocada e uma imagem grosseira. Às vezes a composição poética até se vangloria de imagem e ritmo toscos, mas se o poema não é bom precisa ser apagado, degolado, suprimido. Perdi a conta dos rebentos que assassinei por esse mundão de palavras afora. Confesso, sinto um prazer imenso em deletar um enfadonho poema... zap! E rolam cabeças.

RV -Bruxo, o que faz seu caldeirão borbulhar nas noites de luar? (Cris de Souza)
DB –Em noites de luar sinto uma sede de vampiro. No dia seguinte vejo sangue [o meu próprio] da veia que mordi: é uma desgraça ter os caninos tão afiados e um coração tão sonhador.
RV - Como você definiria o lacaio da poesia? (Cris de Souza)
DB – uma criança [ou um louco ou um santo] que escreve versos e  desde cedo aprendeu a ultrapassar o corredor escuro e a ouvir as paredes trincando os dentes.
RV - “ O poema pode explodir o coração. “, de Domingos Barroso. Corre mais risco o poeta ou o leitor na oração? (Cris de Souza)
DB – O risco sempre será do poeta. Digo, o risco verdadeiro e sem falsos espasmos. O leitor de poesia, consciente e límpido, há de manter uma íntima distância [daí se ouve melhor o coração do poeta]. Aliás, o que o poeta sente já é um mundo de coisas suspensas. O leitor se é para morrer ou exaltar-se de júbilo, faça-o apenas enquanto o poema é lido, depois esqueça o poema, esqueça o poeta e aprecie a vida na sua forma mais simplória. O poeta deveria fazer o mesmo, mas é inútil. O poeta é delicado e humano demais para ver outra vida com outros olhos senão os seus de passarinho epiléptico.
RV - A tua poesia consegue a sublimação das coisas simples: uma formiga ou um chinelo são tão carinhosamente tratados liricamente como a mulher ou a própria alma. Opção estética ou o reflexo do teu olhar sobre a vida? (Jorge Pimenta)

DB – Creio que o maior milagre de todos é quando o poeta troca de pele e de alma com as coisas ao seu redor ou com aquelas já adormecidas em sua memória. A epifania que transborda dessa comunhão [acredito piamente] é a plena salvação do poeta. Permita-me contar uma historinha, quando era bem pequeno [cinco ou seis anos] estava brincando no quintal e senti uma vontade de grávida de comer farofa de ovo, alonguei-me então a flertar uma galinha tão delicadamente que diante dos meus olhos a galinha pôs um ovo, peguei-o maravilhado e fizeram-me uma farofa. Matei a fome e a partir desse dia entendi uma verdade: podemos amar as coisas [bichos ou objetos] como se amássemos gente. O que escrevo, sobretudo o que escrevo encantado, é apenas o meu coração fiel à delicadeza, a mesma delicadeza daquele dia em que troquei de alma com uma galinha e comi farofa de ovo.
RV - Aprendi, em hermenêutica, que a reiteração de uma ideia, de uma palavra, de uma sensação a torna chave na construção textual. A alma e o pecado são conceitos recorrentes na tua poética. Que relação mantêm um e outro com o eu-lírico e o próprio poema? (Jorge Pimenta)
DB – Quando sou tomado pela maravilha de construir versos o que me estimula é aquela atmosfera mágica entre um tijolo erguido pela mente e outro tijolo pelo coração. Tenho absoluta consciência dos meios briosos [e muitas vezes medíocres] de trabalhar um poema. Por isso, escrevo atento e disperso ora observando a mente em sua labuta, ora observando o coração em seu ofício próprio. É fácil sumir o poema se o poeta principiar apenas pela técnica, como é notória a tolice de um eu-lírico em que tudo é encharcado de suspiros. Sinceramente quando sou tomado pela maravilha de construir um poema o que mais desejo é aquele acidente vascular poético cujo sangue é um sangue novo que queima minhas veias. Não há ideias, palavras ou sensações que valham a pena quando o poeta não os merece, e para merecer esse mundão de magia e de cristalina consciência o poeta há de ser apenas verdadeiro com sua morte [que é um renascimento].
RV-- Confesso-me uma admiradora ardorosa e comovida com sua poesia. Minha primeira pergunta é muito simples: A solidão é boa companhia? Rossana Mazza)
DB – A solidão é uma entidade louca, portanto procuro fugir dos seus olhos quando escrevo. Para mim, escrever não é um ato solitário, mas um sopro de plenitude. Solidão apenas quando termino o poema e me vem ao rosto aquele vento frio.

RV - - Em sua poesia, você cria uma essência mágica para todas as coisas. Tudo têm alma: objetos, personagens e animais. Tudo tem uma existência além da material.Será por isso que lhe chamam de “bruxo”? (Rossana Mazza)
DB – “Bruxo” foi um carinhoso apelido [presente da belíssima poeta Cris de Souza], mas a minha alquimia é simples e patética: o máximo que consigo quando estou em transe e ver meu coração colado no teto junto da lâmpada; e se apago a luz, vejo meu coração brilhando em chamas. Bruxo mesmo é Machado de Assis. “Ao vencedor, as batatas!”
RV - - Sua poesia é confessional ou existe um “eu lírico” que finge que é dor a dor que deveras sente? Quem lhe influencia? (Rossana Mazza)
DB – Tudo [absolutamente tudo] que escrevo me corta a pele. Às vezes me perco lendo um poema e chorando feito um recém-nascido distante dos seios da mãe O exagero do poema nada mais é que a timidez do poeta, mas ambos [exagero e timidez] são verdadeiros e pungentes. O eu-lírico é uma realidade espantosa e a sua voz também é confessional. Os fantasmas da minha mente [tagarelas e melindrosos] são os que mais me influenciam quando escrevo, e eles já leram uma legião de seres fantasmagóricos. No momento estou diante de Goethe e já sinto saudades de Ezra Pound.
RV – Domingos, conheci a sua poesia relativamente há pouco tempo e gosto muito dela. Passeando pelo Lacaio e voltando lá para o comecinho do blog, deparei-me com um verso do poeta, no qual ele diz: Mas como o fim se aproxima/ deixo-te no mais lindo sonho/ (ainda dormindo) e me mando/ pra minha vidinha de sempre. Minha pergunta é: como é a “vidinha de sempre” do poeta Domingos Barroso? Qual a distância que separa o poeta Domingos (“o Bruxo”) do homem Domingos? (Tânia Contreiras). 
DB – A minha vidinha de sempre no meu quarto largado na cama com o olhar perdido ou no trabalho debaixo do sol com uma cruz ao ombro nutre-se da mesma alma. O meu ser não se divide, não há um rio apartando margens. Pode parecer loucura, mas não há separação entre o poeta Domingos Barroso e o homem Domingos Barroso. A minha cabeça e o meu coração são os mesmos. Não há dia em que eu acorde e não pense em versos [sei que é um caso patológico] ou que eu durma sem ter vivido o dia poeticamente. À mesa ou caminhando não penso em outra coisa senão em tirar proveito da poesia do instante.  Não entendo quando algumas pessoas me perguntam o que me inspira ou que tipo de poesia eu faço, ora não existe coisa na minha vida que não se reverta em poesia: desde a rachadura da parede ao pé de um pombo. E as imagens da minha infância? E os objetos ao meu redor? E as ideias borbulhando? E a artrite do corpo? E o silêncio da alma? E os sonhos impetuosos? E a razão do tempo? Parece mesmo loucura, mas sou o que sou: um poeta sem trégua. E mesmo que eu não escreva [angústia dilacerante] continuarei sendo, seco, moribundo, mas ainda um poeta.
RV - Qual a importância legítima da poesia em sua vida? Existe um empenho diário e constante de sua parte ou trata-se de uma expressão sazonal? Quem é o Domingos afora a poesia? (Rossana Mazza)
DB – Se me faltasse a poesia me faltaria a alma e sem alma eu seria um espantalho sem cabeça debaixo de uma tempestade de fogo e de alfinetes de gelo.
RV - Domingos, querido, tua poesia aborda com maestria as questões do cotidiano da alma, muitas vezes tecendo-se entre o abstrato dos sentimentos e questionamentos, e as imagens dos objetos mais corriqueiros. Como a tua pena costura essas imagens, o que te faz descrever os sentimentos passeando por estes objetos do dia-a -dia? E há casos em que esta associação possa ter uma significância maior dentro da tua poesia, como por exemplo no caso das botas, citadas em vários poemas? Imenso abraço, poeta!" (Andréa Godoy)
DB – As minhas botas são especiais - um casal extremamente simpático. Foram as minhas botas que me ensinaram a olhar com doçura para o que trazemos para dentro do quarto. Um dia descobri uma rosa colada na sola do pé esquerdo e na sola do outro pé uma tampinha de refrigerante. Há encanto mais encantador?
RV - Domingos, em alguns poemas seus, percebo uma leveza, um senso de humor, difícil de se alcançar em meio aos conflitos e sentimentos intensos que a poesia carrega. Você tem o controle dessa expressão? O tom é intencional? (Lelena Camargo)
DB – Controle não tenho, já que as batidas de asas do meu pégaso
muitas vezes me derrubam sobre um arco-íris, e nós sabemos que quando se desliza pela curva do arco-íris não se sabe o que há lá embaixo. Há versos tão plenos de si mesmos que só me pedem pouquíssimos reparos, então racionalmente bobo introduzo no poema alguns olhares infantis [são os mais espirituosos], sobretudo quando o poema me parece garboso demais. Sim, vivo ciente das minhas travessuras, daí a sombra sonsa do meu sorriso - como diria Tuca.

RV - O teu universo lírico, Domingos, é povoado de pequenas criaturas em desassossego. Assim como o sentidos remetem a uma paisagem surreal, embora carregada de fragmentos da realidade. Como você (a)borda essa teia poética? E uma pergunta fora de contexto: existe manual para domar formiguinhas? (Assis Freitas)
DB – É bom tecer com o que temos na mão - eu bordo extensas e coloridas mantas que envolvem seres fantásticos porque são eles a minha realidade; e para domar formiguinhas não bastam migalhas de pão e colherezinhas de açúcar. Confidencio para os incautos nesse ramo que formiguinhas não gostam de comida na boca [como alguns profissionais adestram cãezinhos]. Formiguinhas só se dobram o gênio e se entregam quando o sujeito olha nos seus olhos profundamente e beija-lhe a boca. Mas deve-se ter muito cuidado, há formiguinhas que odeiam a saliva humana, principalmente a de poetas românticos [o meu caso]

RV – “A minha vida é uma multidão onde, não sei quem, em vão procuro/o meu rosto», gravou em verso Manuel António Pina; onde o rosto do Poeta? Onde na multidão, sozinho no espaço, à procura de infinito, onde o “rosto” do poeta no poema? (lLeonardo B.)
DB – Nos versos que escrevo brilha todo o meu rosto [e mais aqueles olhos ocultos que observam o mundo e tateiam a vida]. A multidão não vive fora, tampouco o deserto - o meu infinito poético explode da junção desta consciência, eis a graça.
RV - E por gravar versos, escreveste um dia que “Um poeta desatento é uma palavra/ intrusa que aborta e sangra/ o poema.”: onde te começa esse infinito do Poeta, essa reflexão entre o homem (uns diriam de seu destino, vá…) e o seu sentido da vida, enquanto aprendiz de Infinitos, enquanto Poeta Atento? (Leonardo B.)
DB – Sinto uma pontada no coração quando perco um poema pelo simples fato de estar distraído [ingrato com o momento mágico]. Para escrever ungido do instante poético é preciso que eu seja zumbi e borboleta debruçados sobre os versos. Os zumbis lembram-me que um dia conheci de perto a terra e os seus vermes, e as borboletas que fui céus e nuvens. O meu destino é montado todos os dias, verso a verso, e o meu infinito [para meu deleite] muitas vezes engana meu olhar e a perspectiva que suponho ter do espaço e das sombras.
RV - Domingos, há uma passagem num livro de Thomas Mann, Sua Alteza Real, em que é promovido um concurso de poesia, e o poema vencedor era um verdadeiro hino de exaltação à vida, seus males, mas suas infindáveis belezas e delícias também, tudo escrito na primeira pessoa. O Rei quis então saber do poeta como ele fizera aquilo: imaginara? vivera aquelas experiências? O poeta responde que era apenas intuição e imaginação (tal como F. Pessoa dizia que sentia com a imaginação), que se vivesse daquela forma sequer teria tempo e disposição de escrever, que na verdade levava até uma vida bem tranquila e regrada. O rei conclui dizendo que a nossa imaginação cria uma quadro bem diferente da vida dum poeta. Como você vê isso, essa coisa do poeta-personagem? E você se vê como um personagem de seus poemas? (Marcantonio)
DB – A imaginação não é um truque, uma fraude, um logro, ao contrário, a imaginação carrega em si mesma um mundo tão real quanto aquele que aprendemos a ver como uno. Quando escrevo versos o meu corpo muda [pulso, suores, batimento cardíaco], logo torna-se então uma realidade plausível. Muitos diriam que os sonhos também causam humores fisiológicos, digo – os sonhos também são reais. Por isso mesmo não comungo do espírito de que o poeta é um mentiroso e que tudo que escreve são viagens etéreas. Lembrando Fernando Pessoa [no seu famoso poema sobre fingimento e dor] se observarmos atentamente o que o imenso poeta português alumia, perceberemos – o mundo que o poeta sente, embora muitas vezes profundamente quimérico, é a sua mais transparente realidade. A única personagem que sou, sou eu mesmo e não há cisões. A vida de um poeta é uma realidade especial - em toda a sua grandeza e em toda a sua miséria.
RV - A sua poesia se dá num espaço muito intimista. O que significa para você a sua terra? (Marcantonio)
DB – A minha terra é onde o meu coração bate, e o meu coração vive deslocando-se entre minhas costelas; às vezes sinto o cheiro do tempo em que as folhas das mangueiras do casarão dos meus avós eram peixes de Isla Negra, mas só penso e me silencio. Sei que pouco canto sobre minhas serras e minhas fontes [nasci no Crato, na região do Cariri cearense] talvez eu ainda tenha muito o que morrer pela minha aldeia. Ou, possivelmente, tudo que vivi lá gravara-se definitivamente dentro da minha alma, sem alarde sob a forma de uma memória intocável. Pensando bem, creio que minha terra é o meu cordão umbilical do qual só tenho lembrança que foi embrulhado e lançado ao telhado. Choveu muito desde então, e as águas que levaram meu cordão umbilical ao fundo da terra talvez me tenha fertilizado e eu seja agora uma árvore [ah, alegro-me] uma árvore  fincada no meu vale caririense...
RV - Se você fosse um pintor, o que preferia pintar: interiores como o quarto de Van Gogh? Paisagens exóticas como as do Gauguim do Taiti? Naturezas-mortas cubistas como as de Picasso e Braque? Ou as constelações de Miró? (Marcantonio).
DB – Paisagens exóticas, claro, ao lado de uma nativa - e depois pintaria a própria nativa em um fabuloso nu artístico. Passaria décadas pintando, mudando a pequena de posição e a luz de tonalidades [é que as nativas são impressionantemente sensuais e de um brilho no corpo estonteante...].

Participaram desta entrevista:
Joelma Bittencourt, Celso Mendes, Sandrio Cândido, Wilden Barreiro, Tuca Zamagna, Luiza Maciel, Iracema Buscaccio, Cris de Souza, Jorge Pimenta, Rossana Mazza, Tânia Contreiras, Andréa Godoy, Lelena Camargo, José de Assis  Leonardo B., Marcantonio Costa

Pina de Wim Wenders em 3D



Esse filme do grande Wim Wenders é a prova que faltava: o cinema 3D veio para ficar. Hoje grandes diretores como Wenders, Spielberg (Tintim) e Scorcese resolveram brincar de 3D e a brincadeira deu certo.


Pina do Wenders é maravilhoso, o efeito do 3D na incrível e revolucionária equipe de dança de Pina Bausch, ali em Wuperthal, Alemanha é impressionante. A sensação é que o espectador não está em um cinema, mas numa sala de dança.

É uma obra prima. Recomendo com 5 estrelas. Sensível, mágico, poderoso.


sábado, 17 de março de 2012

Canção de outono



As pulsações
Dos violões
Outonais

Fazem o ser
Esmorecer,
Sempre iguais

E todo arfando
Pálido, quando
Soa a hora,
Minh'alma invade
Velha saudade
E após chora.

Se eu assim vago,
Vento pressago
Me transporta ao-deus-dará,
Semelhante à
Folha morta.



Paul Verlaine, França (1844-1896)

quinta-feira, 15 de março de 2012

Por um fio



a faca

o fio afiado

água-lâmina

mãos que amolam

a navalha acariciam

cortando entranhas

carne viva em agonia


a morte em sépia

arrastada pela dor

espreita da janela

o olhar que cai

sobre um passado

de sombras recicladas

quarta-feira, 14 de março de 2012

No Dia Nacional da Poesia...


(Artista: Liu Yuanshou)



Poesia, 
lava minha boca 
e me beija o dia
- o teu dia -
traz esse hoje,
com gosto de eternidade
e faz a cama à tua vontade,

fode com as minhas tormentas
em selvagem coito, e acaricia
minha lânguida calmaria,
traz o gozo das palavras
- a agonia fina -
de quem te escorre
pelas veias




[Andrea de Godoy Neto]


Borboletas acesas


Não olhe nem chore, criança. As bombas que estão caindo não são bombas: são borboletas de vinho. Não chore, criança, pois essas aparentes bombas são borboletas de vinho tinto, que escaparam de suas garrafas. Veja! Observe! Elas já chegam zunindo. Tudo passa. E é breve. E ainda continuaremos vivos no final das contas. Estes, que agora caem, ainda estão dormindo. Pelas picadas dos voos das asas apressadas dessas borboletas violetas que fugiram das garrafas. Mas logo acordam. Depois de tudo. Chegando em casa, pintaremos o portão de branco. Limparemos a sujeira que deixam atrás de si essas borboletas bêbadas. Não choraremos. Digo a você que ficaremos ali, protegidos, atrás do bombardeio. Não são inimigos, como nos filmes. São só uns homens um pouco perdidos. Já te disse que na Terra todos se amam, como você ouviu na Igreja? E aquele incêndio, ali, naquela casa, são borboletas de fogo, que fugiram do casulo. E caíram, sem asas.

(Marcelo Novaes)

Da brutalidade


No varal,
a corda da forca
vestida de branco
como um lençol imaculado
de prazer
e de alma
com o coração preso
por ganchos,
sente a brutalidade
das solidões
sem vento.

À procura ...




tenho des-andado por labirínticos caminhos
riscado palavras, alinhavado frases

tenho rasgado verbos, ainda
não conseguí tecer uma veste

para o corpo da palavra

estrelas de nenhuma grandeza
instalaram-se em minha caixa craniana

no apagar das luzes!

Quem cria é cri-ativo?
Cria quem (é) cria-a-dor?
Eu cria que sim,

mas a dor de quem cria
até cair nos subterrâneos da palavra

mergulha o subsolo do verbo

à procura de sua raiz, dele

do verbo nascer.

Não nascí ontem,

era um traço, tornei-me

linha, um rabisco, sinais,

tornei-me som

minha voz ecoou e tento

desabrochar todos os dias.

As letras estão reticentes

as palavras quase mudas
coniventes com os habitantes desse castelo

transformado em prisão.
Meu desejo é ver desmoronar os paradoxos

camuflados em metáforas e antonomásias!

Passei tão sob a ponte
que mergulhei no ébano da noite de meus olhos.
Profundas são as águas salgadas que marejam
minhas faces revolvidas.
Do outro lado da rua ví
sua outra margem já assoreada
e emergí assustada:
estava no seco do leito acordada
e sem estrelas!
Deambulo em palavras para

desnortear caminhos

estabelecidos em mapas de antanho

preencher o vazio que insiste em atravessar-me,

completar ausências

fraturas abissais que

levam ao abismo da solidão.

Da criação?

terça-feira, 13 de março de 2012

Afinal o que importa

No desalento do corpo

No desalento do corpo,
recebe instruções alma.
No desalento dos gestos,
desfaz-se, em cruz, o instinto.
E sofrem  e emudecem e prendem-se às
semelhanças
as carnes e as argilas
das casas em que ninguém habita,
das casas em que há sob a pele
outras paredes
e em que desordenam-se as cores com
o que brincamos
de destino e de vida.

domingo, 11 de março de 2012

A ventania


Assovia o vento dentro de mim.

Estou despido. Dono de nada, dono de ninguém, nem mesmo dono de minhas certezas, sou minha cara contra o vento, e sou o vento que bate em minha cara.


Eduardo Galeano, O livro dos abraços

Convite

sexta-feira, 9 de março de 2012

A rosa e o louco






 A rosa vermelha amarrada ao pé do louco é uma imagem que não me sai da cabeça, faz tempo. O homem negro, nu, chegou com a pele brilhante, o riso esboçado, completamente alheio à paisagem em sua volta. Todos os olhares convergiram para a sua nudez, e o louco caminhava firme, indiferente ao alvoroço que provocava nas dezenas de pessoas na praia.


Sem ter superado de todo o meu fascínio pela loucura, observei atenta cada passo marcado do homem, que vinha agora quase em minha direção. Uma marcha para a frente, e lá estava ele diante de mim, mirando o mar. Observei no seu tornozelo esquerdo uma rosa vermelha presa com um cordão encardido, sua única indumentária. O homem louco ornava-se antes do caminhar incerto e engendrava delicadezas antes de sair errante, até dar no mar, com deslumbramento de criança.

Sem tirar os olhos do homem, pensei na beleza que tinge suavemente a loucura. No poder da poesia que enrubrece a insanidade sem cor. Refleti sobre as pontes que se fazem entre as águas bravias do inconsciente e a árida lucidez dos que jamais enlouquecem. Entendi que o homem, louco, se cobria com a veste mais íntima do seu delírio; e com sua demência amparava a fragilidade da flor.

Inclinando parcialmente o corpo e levantando a perna esquerda, o louco desatou o nó da corda encardida e deitou com maciez a rosa sobre a areia. Sorrindo para o nada, caminhou em direção ao mar e atirou-se com felicidade às águas que pareciam esperar-lhe. Antes mesmo do primeiro mergulho, dois salva-vidas saltaram sobre o homem, que continuava a sorrir, trazendo-o de volta à areia, agora seguro pelos dois braços.

Já em terra, o homem apanhou o cordão encardido, ajeitou suavemente a rosa vermelha no tornozelo, e saiu andando com um sorriso matreiro na direção da rua.

FLOR BELA ESPANCA

quinta-feira, 8 de março de 2012

Ritmo e Gesto


Recomendo porque vale a pena. Quem estiver em São Paulo dá uma passada - na manhã de sábado - na Pinacoteca do Estado de SP, o  evento  é imperdível. O lançamento do livro Ritmo e Gesto do fotógrafo Rogério Medeiros.

Só se for louca de pedra

Toda mulher é doida. Impossível não ser. A gente nasce com um dispositivo interno que nos informa desde cedo que, sem amor, a vida não vale a pena ser vivida, e dá-lhe usar o nosso poder de sedução para encontrar the big one, aquele que será inteligente, másculo, se importará com nossos sentimentos e não nos deixará na mão jamais. Uma tarefa que dá prá ocupar uma vida, não é mesmo? Mas além disso, temos que ser independentes, bonitas, ter filhos e fingir de vez em quando que somos santas, ajuizadas, responsáveis, e que nunca, mas nunca, pensaremos em jogar tudo pro alto e embarcar num navio pirata comandado pelo Johnny Depp, ou então virar loura e cafetina, ou sei lá, diga aí uma fantasia secreta, sua imaginação deve ser melhor que a minha.
Eu só conheço mulher louca. Pense em qualquer uma que você conhece e me diga se ela não tem ao menos três dessas qualificações: exagerada, dramática, verborrágica, maníaca, fantasiosa, apaixonada, delirante. Pois então. Também é louca. E fascina a todos.
Nossa insanidade tem nome: chama-se Vontade de Viver até a Última Gota.
Só as cansadas é que se recusam a levantar da cadeira para ver quem está chamando lá fora. E santa, fica combinado, não existe. Uma mulher que só reze, que tenha desistido dos prazeres da inquietude, que não deseje mais nada? Você vai concordar comigo: só se for louca de pedra.

Martha Medeiros

terça-feira, 6 de março de 2012

A felicidade, a autoajuda e a fotografia nas redes sociais

Hoje em dia para se sentir a pessoa mais infeliz do mundo basta abrir uma conta no Facebook e sair adicionando os conhecidos. Se a melancolia e a depressão eram o mal do séculos XIX e XX, no presente centênio a tristeza é coisa, realmente, do passado. Explico.
No Facebook a felicidade transborda, sendo maior que a quantidade de areia encontrada no Saara. Todos têm a melhor família do mundo, os melhores amigos, os melhores empregos, os namorados(as) mais perfeitos, os melhores animais de estimação, o melhor gosto culinário, o mais apurado gosto músical, enfim, tudo responsável por tornar o indivíduo o ser mais feliz da face da terra. Os problemas, quando aparecem, dão as caras apenas durante a semana, pois de sexta a domingo, todos têm um final de semana perfeito.

Confesso que tenho inveja de tanta felicidade e me sinto mal por ser tão medíocre, enxergando a vida de maneira mais cinza. Admito que não encontrei no Facebook este gás hilariante inalado por todos. Meu final de semana, assim como meus amigos, estão longe de serem perfeitos. O domingo, então, não é tão feliz como o de todos os conhecidos da rede social. Para falar a verdade, é um dia chato que me causa desespero quando escuto a música de abertura do Fantástico e a voz do Zeca Camargo, ambas me lembram a melancólica e cansativa segunda-feira.

Além da felicidade extrema, no Facebook a autoajuda é também abundante. Pode-se dizer que as duas andam de mãos dadas. Afinal, como não ser feliz recebendo e escrevendo conselhos amorosos, profissionais, financeiros, etc. Há uma solução para tudo e para tudo uma explicação. Para isso, é só seguir a cartilha e, claro, ser feliz.

Penso também que nesse ambiente virtual tão feliz, os textos não bastam. É preciso, por meio de fotos, mostrar aquele final de semana perfeito, a família e os amigos mais felizes do mundo, usando aplicativos como Instagram para dar aquele visual retrô. Imprescindível , como ser alegre no Facebook, é tirar autorretratos e colocar uma legenda embaixo “estou terrível”. Ora, é primordial agir com modéstia enquanto aguarda um amigo feliz dizer que você está maravilhosa(o).

Se você está deprimido, talvez os anti-depressivos não sejam a solução. Para ser sincero, esqueça-os! O melhor mesmo é criar uma conta no Facebook e navegar em um mar de felicidade ao lado dos amigos mais perfeitos do mundo.

Lauro Drummond, em Literatura em foco

domingo, 4 de março de 2012

The Wailin' Jennys - Storm Comin'

Cuca Roseta - Nos Teus Braços



Cuca Roseta canta "Nos Teus Braços", um tema com letra e musica assinadas por si. Um dos temas do seu mais recente disco de estreia, que tem tido enorme sucesso e reconhecimento pelos media nacionais e estrangeiros. O mesmo disco é produzido pelo prestigiado produtor e músico argentino Gustavo Santaolalla.

AUgusto dos Anjos

Versos Íntimos – Augusto dos Anjos

Vês?! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão – esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te a lama que te espera!
O Homem que, nesta terra miserável,
Mora entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera

Toma um fósforo, acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro.
A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa ainda pena a tua chaga
Apedreja essa mão vil que te afaga.
Escarra nessa boca de que beija!
( Augusto dos Anjos )


sexta-feira, 2 de março de 2012

O leite dos copos


Escreve sobre o caldo derramado. Sobre a água.
Escreve sobre o leite. O leite da infância, o leite dos copos, o  leite coalhado em flor.
Escreve o leite dos homens.  Do homem derramado na cama, na calçada, na  marca de outros pares, no espanto da ímpar.
Escreve sem caligrafia.
Escreve maculando o lençol branco, desafinando as linhas sem clave na espera de um som de amor.
Escreve partindo-se.
Escreve quebrando-se e em desencanto e em contas, contos, e escreve com as mãos em conchas
guardando as gotas das pérolas e da solidão.

Gira de Yansã - Chegada de Yansã