domingo, 14 de março de 2010

Continuando... (16)


Judite fora uma mulher invulgar. Inesperada. Sobretudo, quando se olhava para o lugar de onde vinha, primogénita de um abastado comerciante judeu, descendente daqueles que fugiram para o abrigo das terras quentes de África, quando os ânimos na Península se tornaram demasiado encarniçados contra os filhos de Abraão.
Filha predilecta de seu pai, uma menina-mulher, mimada sem ser caprichosa, teve desde muito criança a habilidade de conseguir sempre tudo o que desejava.
A sua perícia ou talento, nem era tanto a satisfação das suas vontades, mas o fazer crer aos outros que era seu, o desejo de satisfazê-la.
No dia em o pai entrou em casa acompanhado por aquele homem alto e bonito, teve a certeza que toda a vida esperara. Tinha sido por ele que recusara todos os casamentos arranjados pela família.
Fonte de escândalos na comunidade, a filha mais velha de Salomão, era para a vizinhança um assunto de conversa e embaraço, mas para seu pai, uma fonte de orgulho e a única pessoa com quem podia falar de negócios ou de poesia, com a mesma confiança e prazer.
Judite, a mulher mais extraordinária que ele tinha encontrado, com uma chama no olhar que o incendiou mal a viu.
Na terceira noite, no calor da madrugada, foi acordado pelo seu corpo nu.
Era virgem, Judite, quando se ofereceu ao português Afonso.
Ele, um General, foi derrotado naquela noite, por uma mulher.

- Judite… não faças de mim um novo Holofernes…

Implorou, rendido e mergulhou nela, como se o mundo começasse e terminasse naquele instante, como se a vida e a morte fossem uma só, sem tempo nem espaço, como se a suprema razão de existir mais não fosse que o corpo daquela mulher.

(continua)

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