quinta-feira, 22 de abril de 2010
A Felicidade dos Outros
Ela fez o que geralmente faz: cedeu. E cedendo perdeu pontos no relacionamento. Que merda, repetia para si mesma. Falhou na estratégia, na escolha, na opção. Ela fracassou e exitou ainda mais. Deprimida foi ao supermercado comprar ração para os gatos, mas não resistiu ao ver uma magnífica torta de chocolate branco. Voltou para casa e comeu inteirinha. Não deixou sequer um farelo para os animais. Limpou a cozinha e foi deitar.
Quando ele chegou ela estava dormindo. Apenas de calcinha cinza, as coxas grandes sobre o cobertor de oncinha. Afastou os gatos e sussurrou: minha pérola. Ela sonhava que estava em outros lugares, fazendo outras coisas com outros homens, mas aquela voz geralmente ríspida e agressiva que ela tanto conhecia tinha, desta vez, um tom diferente: carinhoso, amigo, inclusive sensual e provocante. Ela esboçou um bocejo, virou para o lado e sentiu o bafo quente do hálito gasoso. O que você quer agora? ela perguntou já excitada. Nada, não -- disse ele um pouco sem jeito --pode ficar como está, vou ver televisão na sala, não quero te atrapalhar, os gatos vêm comigo.
E aquele momento se embaralhou no tempo. Oportunidade que se dissipou diante de suas próprias rotinas e neuroses. Assim funciona aquela casa, aquelas pessoas, os nossos personagens, que vivem suas vidas. E nós, que estamos do lado de fora, podemos nos equivocar no julgamento da felicidade dos outros, inclusive deste casal. Podemos interpretar, de uma forma ou de outra, de acordo com as nossas noções, ambições e histórias de vida. Fazemos conjeturas, apostas e muitas vezes nos equivocamos. Essa história do casal que, aparentemente, não se entende ou que não consegue atingir uma certa empatia e cumplicidade pode ser também - por que não?- uma história de amor e felicidade. Vejam as carinhas felizes dos dois com os seus gatinhos. Eles não são uns mimos?
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O que é a felicidade é algo que adoraria descobrir. Mas como obtê-la se não sei defini-la. Saberei um dia reconhecê-la? Enquanto não descubro, pelo menos me conforta o bem estar de uma torta de chocolate branco de vez em quando. Me identifiquei com a pobre diaba, pois além de adorar torta de chocolate branco, muitas vezes tentando evitar brigas, acabei aceitando o que não devia, e não foi uma boa estratégia. Muito boa essa sacada.
ResponderExcluirAbraço,
Terráqueo
Felicidade é algo relativo... e que bom! Cada um com seus desejos, seus anseios, e seu limiar... O que me faz feliz pode não fazer quem está ao meu lado feliz, e assim por diante. Julgamentos também são relativos...
ResponderExcluirEnfim.
Este comentário faz algum sentido? rs
Abraços, e parabéns pelo texto!
A felicidade dos outros é sempre uma hipótese.
ResponderExcluirA felicidade da gente também.
Gostei muito deste texto (e da imagem, magnífica), Carlos Eduardo: super provocativo! :-)
ResponderExcluirFoi uma leitura deliciosa. Como sempre.
ResponderExcluirExtremamente profundo e belo como um poço de água pura e cristalina de sítio.
ResponderExcluirParabéns!
Um abraço,
Maria Valéria.
Obrigado, Terráqueo, Bípede, Janaina, Angel, Gerana e Maria Valéria. Na verdade, ando em conflito com o meu Blog Depósito do Maia -- que é um tanto político -- e não dou espaço para esses pequenos contos.
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