quinta-feira, 13 de maio de 2010

"Instruções para chorar"



Deixando de lado os motivos, atenhamo-nos à maneira correta de chorar, entendendo por isto um choro que não penetre no escândalo, que não insulte o sorriso com sua semelhança desajeitada e paralela. O choro médio ou comum consiste numa contração geral do rosto e um som espasmódico acompanhado de lágrimas e muco, este no fim, pois o choro acaba no momento em que a gente se assoa energicamente.


* * *


Para chorar, dirija a imaginação a você mesmo, e se isto lhe for impossível por ter adquirido o hábito de acreditar no mundo exterior, pense num pato coberto de formigas ou nesses golfos do Estreito de Magalhães nos quais não entra inguém nunca.
Quando o choro chegar, você cobrirá o rosto com delicadeza, usando as mãos com a palma para dentro. As crianças choram esfregando a manga do casaco na cara, e de preferência num canto do quarto. Duração média do choro, três minutos.
Extraído de "Histórias de cronópios e de famas", de Júlio Cortázar, que nasceu na embaixada da Argentina em Ixeles, distrito de Bruxelas, na Bélgica e aos 4 anos foi para a Argentina com os pais. (1914-1984)

4 comentários:

  1. Da próxima vez em que eu me desesperar, vou lembrar de tudo isso... ;)

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  2. agradezco por este post de Cortázar.
    y adoré la fotografía, que, pienso, da un tono más grave al relato gracioso de Julio.

    un beso*

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  3. Imbatível e incomparável Cortázar. Que grandes trechos você selecionou. Muito bom post!

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  4. Cirandeira: Muito atual e apropriado para o contexto atual. É como se esse texto tivesse sido escrito hoje! Como seria se Cortázar estivesse aqui nesse século?! Incrível como ele viveu bem adiante do seu tempo.
    Com amor e carinho,
    Silvia

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