segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Em tempos de carnaval



Por Aeronauta

Em tempos de Carnaval juntei-me a Cecília, em seu quarto de cortinas verde oliva, para meditarmos. O poema que segue é para ser lido, preferencialmente, em voz baixa:


DISPOSIÇÕES FINAIS

Cecília Meireles


Não é preciso que me visitem, se estiver doente,
embora o convívio dos amigos seja, comumente, agradável.

Não é preciso que exclamem, por estar morta: "Coitada!" "Que pena"!,
embora seja esse o uso normal, na terrena vida.

Não é preciso trazerem flores, embora o mundo
das flores seja como o dos mortos, profundo e belo.

Não é preciso vestirem luto, - nem isso a mais ninguém ocorre...
- embora ajudasse a apagar quem morre, com mais sombra.

Não é preciso rezar ofícios, embora a minha sorte
fosse esta de só pensar no que separa morte e vida.

Não é preciso nenhuma notícia ou comentário avulso,
embora eu sentisse o mundo bater no meu pulso, tão forte.

Principalmente, é preciso que ninguém chore nem me recorde com tristeza,
porque seria absurdo, contra a natureza das coisas:

Os mortos não querem nada, no seu reino grande e frio,
e estão livres de convenções, e nada vale o amor tardio. O amor enfim.



Imagem: "La vida es bella", por AnaMa MC.
(www.flickr.com)

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