segunda-feira, 30 de agosto de 2010

A Cultura "Fast Food" e a Morte da Conversa



Impossível discordar dessa senhora, a professora da Universidade de Santa Clara na Califórnia, Janet Flammang, 62 que deu uma entrevista na Folha de S. Paulo de ontem no sentido de que "Fast food agrava crise de civilidade entre americanos".



Uma das coisas boas da vida é sentar numa boa mesa, comer, beber e conversar. A cultura "fast food" está acabando com esses prazeres. E isso traz consequências.
Diz ela:

Folha - A sra. diz, em seu livro, que a democracia se beneficiaria de refeições mais longas. Como relaciona as duas coisas?

Janet Flammang - Desenvolver a arte da conversação é extremamente importante para aprender a discordar de forma civilizada. E aprendemos essa arte à mesa.Quanto menos tempo dedicamos às refeições, mais colocamos essa habilidade em perigo.À mesa, há um incentivo para discordar sem dar aos outros uma indigestão.Muito da política atual nos EUA é uma política de ataque, na qual se quer marcar pontos e derrubar o oponente, e não ouvir.O foco do livro é a conversação. A conversa não é uma discussão, há regras sobre como ouvir, esperar a vez e guardar o que tem a dizer. A coisa mais próxima de uma conversa é a diplomacia, que todos nós achamos ser extremamente importante.O que me intriga é: por que não estudamos como fazer as pessoas se comportarem com diplomacia?


Folha: Isso está piorando? A conversa está morrendo?
Sim. Há muitos estudos que indicam que gastamos, em média, 20 minutos no jantar, à mesa, e mais e mais pessoas já nem se sentam para dividir uma refeição, pegam algo e saem correndo.Meu livro é sobre a situação americana, mas há evidências de que outras culturas estão se tornando mais como os EUA, onde o trabalho é a coisa mais importante e você é consumido por atividades.As pessoas não param para pensar no custo de não se sentar e ter conversas, e cara a cara, porque é claro que muita coisa hoje é eletrônica.



Matéria Completa e entrevista abaixo:




"Fast food agrava crise de civilidade entre americanos"


Tese é defendida por professora californiana, que vê reflexos na situação de radicalismo político do país

Estudos mostram que pessoas gastam apenas 20 minutos por refeição, o que desestimularia conversa e tolerância

CRISTINA FIBE
DE NOVA YORK

Há uma "crise de civilidade" nos Estados Unidos que afeta principalmente a política, e uma das razões para isso é o fato de as pessoas dedicarem cada vez menos tempo às refeições em grupo.
A tese está no livro "The Taste for Civilization - Food, Politics and Civil Society" (o gosto pela civilização - comida, política e sociedade civil; à venda na Amazon.com por cerca de R$ 40, mais taxas), da cientista política Janet Flammang, 62.
Professora da Universidade Santa Clara, na Califórnia, Flammang diz que a "arte da conversação" é aprendida à mesa, onde "há um incentivo para discordar sem dar aos outros uma indigestão".
Em entrevista à Folha, Flammang diz ver esse problema refletido no Congresso, onde os "políticos de partidos diferentes não socializam". Em outubro, ela participa de painel promovido pelo governo para discutir o assunto, parte do "tour da civilidade por 50 Estados".

A iniciativa é de Jim Leach, ex-congressista que foi nomeado pelo presidente Barack Obama como titular do National Endowment for the Humanities, agência do governo dedicada a apoiar pesquisa, educação e programas públicos em humanidades.
Leach viaja pelo país, desde o fim de 2009, dando palestras sobre "o discurso do ódio e os seus perigos". Leia abaixo os principais trechos da entrevista.

Folha - A sra. diz, em seu livro, que a democracia se beneficiaria de refeições mais longas. Como relaciona as duas coisas?
Janet Flammang - Desenvolver a arte da conversação é extremamente importante para aprender a discordar de forma civilizada. E aprendemos essa arte à mesa.Quanto menos tempo dedicamos às refeições, mais colocamos essa habilidade em perigo.À mesa, há um incentivo para discordar sem dar aos outros uma indigestão.Muito da política atual nos EUA é uma política de ataque, na qual se quer marcar pontos e derrubar o oponente, e não ouvir.O foco do livro é a conversação. A conversa não é uma discussão, há regras sobre como ouvir, esperar a vez e guardar o que tem a dizer. A coisa mais próxima de uma conversa é a diplomacia, que todos nós achamos ser extremamente importante.
O que me intriga é: por que não estudamos como fazer as pessoas se comportarem com diplomacia?

Isso está piorando? A conversa está morrendo?

Sim. Há muitos estudos que indicam que gastamos, em média, 20 minutos no jantar, à mesa, e mais e mais pessoas já nem se sentam para dividir uma refeição, pegam algo e saem correndo.Meu livro é sobre a situação americana, mas há evidências de que outras culturas estão se tornando mais como os EUA, onde o trabalho é a coisa mais importante e você é consumido por atividades.As pessoas não param para pensar no custo de não se sentar e ter conversas, e cara a cara, porque é claro que muita coisa hoje é eletrônica.

Quais são os sinais de falta de civilidade nos EUA?

Podemos começar pelo Congresso. Tem havido forças-tarefa pela civilidade promovidas por congressistas, que dizem que perdemos a civilidade na Casa, a habilidade de socializar com pessoas de outro partido e de discordar.Muito disso se relaciona à chamada revolução republicana de 1994, quando Newt Gingrich tomou conta [da Câmara dos Representantes].
Muitos veem isso como um ponto-chave, porque ele disse aos republicanos que voltassem aos seus distritos todos os finais de semana e não mudassem suas famílias para Washington.
Isso significou que havia muito pouca socialização entre congressistas. Hoje, as salas de jantar estão vazias, eles não socializam.

As iniciativas de Michelle Obama [pela alimentação orgânica e contra a obesidade infantil] tiveram resultado?

Qualquer coisa que a Casa Branca faça tem grande importância simbólica. E as pessoas que trabalham na Casa Branca estão muito mais sensíveis a essas questões do que antes.
Não só o Departamento da Agricultura, mas outros departamentos estão mais preocupados com produtos de qualidade e com a crise da obesidade. Michelle não tem poder oficial, mas, nos EUA, o comportamento da "primeira família" tem grande importância simbólica.

Repito uma pergunta que a sra. faz: como é possível encontrar tempo para rituais alimentares em uma cultura acelerada e workaholic?

Depende de cada lar, não há uma resposta única.
Sei que em lares em que os salários são baixos é muito difícil, mas a primeira medida a tomar é encontrar uma maneira para que haja pelo menos um jantar comum [por semana].
Questiono também o número de horas que os americanos dedicam ao trabalho. Devemos ter cargas horárias mais humanas, para que os pais possam voltar para casa antes de os filhos dormirem.
A Europa tem dias mais curtos e igual produtividade. Falo no livro sobre o modelo europeu de menos horas, mais tempo para a vida.


7 comentários:

  1. Fui criada com horário de café da manhã, almoço e lanche da tarde, quando todos nos sentávamos à mesa, onde comíamos com educação e conversávamos muito. Meus filhos também foram criados assim. Hoje, 2 moram em cidades diferentes pois trabalham, mas a cada 15 dias, fazemos nossos encontros e todos nos sentamos outra vez à mesa como sempre foi e nos divertimos muito, já que a família aumentou com a adesão de namorados e namoradas. Acho fundamental essa convivência, horários, e muita, muita conversa, risadas e brincadeiras.
    Ótimo post.
    Beijos e uma linda semana pra vc.

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  2. Foi o primeiro passo dado após a morte do livro... :/

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  3. Coversar tem feito falta, mesmo: ótimo post!
    abraços,

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  4. O urgente está por acima do importante,lá, nos USA...

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  5. Bela frase do Lisarda: o urgente está por cima do importante E conversar, Tânia, é essencial. Também fui criado com horários certos para as refeições onde conversávamos, Lua nova; mas as novas gerações não é bem assim. Bem pensado, Francisco, depois da morte do livro, a morte da conversa.

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  6. Eu como devagar e como pouco e me horrorizo diante do exagero e da pressa e achei uma porcaria a comida americana de lancheria.

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  7. A comida americana de lancheria é bem melhor que a comida brasileira de lancheria.

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