terça-feira, 1 de junho de 2010

Memórias Quebradas

        No início era o nada. Ou muito pouco. Maria, diferente da Virgem e de todas as meninas de seu bairro, não desfilava virtudes, não se submetia a sonhos, nem procurava por respostas. Sua existência, aprisionada em um corpo quase invisível, apenas se arrastava. Diante do eco de outras vozes, Maria nunca ouvia o ressoar interno da própria vibração. Em raras ocasiões, notava um discreto visitante em seus pensamentos, mas ela não o deixava entrar. A lei era a da eternidade e, se a prisão íntima em que vivia era imóvel, ela permaneceria fiel e vazia em seus limites, até o quebrar-se da regra. Andaria, calada, de casa para a escola e da escola para casa e obedeceria os comandos do cotidiano sem discutir. Seria o nada ou o muito pouco estabelecidos e, de sua alma, não surgiriam mais que ínfimas projeções.

Continua aqui nos Contos Marginais.

4 comentários:

  1. Bipede, muito interessante. Lembrei do livro "Nunca lhe prometi um Jardim de Rosas" de Hannah Green. Mostra as vivencias de uma jovem nos mundos por ela criado e aborda muito o tema de Texto, conflitos de relacionamentos baseados em velhos esquemas carregados de preconceito. O personagem se refugia ne seu mundo interior mas seus conflitos não acabam até.... Fascinante para que desejar saber como se resolver nosssos comandos equivocados!
    Beijos carinhosos.
    Sílvia
    http://silminhacolchaderetalhos.blogspot.com/

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  2. Este é um posto Saramagueano. Excelente, Bípede.
    Bjs.

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  3. Obrigada pelos comentários.
    Paulo, você que gosta de escrever contos, se quiser participar dos Contos Marginais, escreva que enviamos o convite para ser autor.

    Bípede Falante

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  4. Maria dormiu mais que sonhou. Optou por sobreviver, apenas. Uma forma menos trabalhosa de encarar a vida. A mediocridade faz cansar apenas quem a observa.
    Bjs

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