De ti guardo amoras e rosmaninho. A cerejeira da casa da avó. Os dias das vindimas e todas as cicatrizes do joelho. De ti guardo o primeiro dia de escola e os funerais dos mais velhos, que vês? nunca mais cá voltaram para nos assustar no Inverno.
De ti guardo o único significado de irmão, o que tenho, porque se não somos filhos da mesma mãe, fomos netos da mesma avó.
De ti guardo o primeiro cigarro e todas as bicicletas do mundo. Guardo as noites de Natal e o medo do corpo a crescer dentro dos anos. Crescemos juntos e a dada altura começamos a viver um para cada lado. Dizem-me hoje que és tão forte, mas eu sei que ainda não sabes o que há para lá do mar. Um dia quiseste saber. Supusemos: um buraco fundo e o vazio. Os teus olhos tremiam como velas e havia um castelo de areia. Quando falo de praia, falo sempre da praia da nossa infância. Eras capitão e pirata e eu simplesmente menina. Sempre fui, simplesmente menina.
De ti guardo todas as asneiras e todos os segredos. Todas as esperanças e medos. Todos os gelados e morcegos. Os desenhos animados e os filmes de terror. Os jogos da bola e as telenovelas de amor. Em ti guardo-me a mim, porque sabes? antes de me apaixonar pelos homens, foste o primeiro a quem amei.
Nenhum comentário:
Postar um comentário