sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Uma égua

(Presente inesquecível que recebi do querido amigo Ricardo, que retomo nas mãos e relembro).

Tudo começou numa floresta de jabuticabas...

Túrgidas, globosas e apetitosas. A égua primeiro sacudiu a crina fácil, vasta e branca como a neve do topo da montanha, e relinchou gostosamente, erguendo as duas patas para o mais alto do alto. As frutas maduras cobriam a pele dos troncos como incontáveis olhos, negros e brilhando, brilhando de cegar até o mais forte dos machos. Que mais fazer senão comê-las, devorá-las todas aos bocados, deixando o caldo cremoso e púrpura escorrer pelo seu pescoço de gazela-égua, longo e elegante como a haste delgada dos ciprestes em noites de lua cheia?

E assim a égua fez, não sem antes celebrar um sagrado e silencioso momento, comungando seu desejo, trêmula, com a terra-mãe, ciscando com as patas posteriores o chão e a relva macia da floresta encantada.

E depois, saciada e feliz como uma fêmea (retorcida de tão nua) que acaba de amar a si própria, com o corpo e as patas pingando a seiva doce e selvagem das jabuticabas maduras, atirou-se desembestada, de pura alegria e sem demora, para o alto da montanha que tudo havia testemunhado.
(Ricardo Chemas)



3 comentários:

  1. Um texto rico em simbolismo, cheio de significados, de sensualidade, que me remete à liberdade de ser por inteiro, à feminilidade em
    sua essência primordial!

    Belo presente, Tânia, o mereces muito bem!

    beijoss

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  2. Lindo texto mesmo, não, Ci? Sou suspeita, mas amo. O cabeçalho ficou show.

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  3. Se o mar adormecer em desvario
    As ondas não mais se formarem
    Se as gaivotas se perderem do ninho
    As árvores mais altas tombarem

    Se o dia não encontrar a manhã
    As nuvens deixarem de chorar água pura
    Se as pedras da ilha roubarem a cor ao verde
    As tua palavras deixarem de ser raiva dura

    E passei para te deixar a minha palavra...


    Doce beijo

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