sábado, 7 de dezembro de 2013

De Albert Camus


 
 
 

Um homem é um homem mais pelas coisas que cala do que pelas que diz. Não falta muito para eu me calar.

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Invictus


 

Dentro da noite que me rodeia
Negra como um poço de lado a lado
Agradeço aos deuses que existem por minha alma indomável
Sob as garras cruéis das circunstâncias eu não tremo e nem me desespero
Sob os duros golpes do acaso
Minha cabeça sangra, mas continua erguida
Mais além deste lugar de lágrimas e ira,
Jazem os horrores da sombra.
Mas a ameaça dos anos,
Me encontra e me encontrará, sem medo.
Não importa quão estreito o portão
Quão repleta de castigo a sentença,
Eu sou o senhor de meu destino
Eu sou o capitão de minha alma.
 
  Esse poema foi escrito em 1875 por Ernest Henley, poeta inglês, servindo de apoio e inspiração para Nelson Mandela (1918-2013) durante os 27 anos que passou nas prisões da África do Sul. 

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Amizade


Certas amizades comprometem a ideia de amizade.
 
*
O amigo que se torna inimigo fica incompreensível,
o inimigo que se torna amigo é um cofre aberto.
Um amigo íntimo - de si mesmo.
 
*
É preciso regar as flores sobre o
jazigo de amizades extintas.
 
*
Como as plantas, a amizade não deve
ser muito nem pouco regada.
 
*
A amizade é um meio de nos isolarmos
da humanidade cultivando algumas pessoas.
 
 
Carlos Drummond de Andrade, em O Avesso das Coisas

Labirinto


 
 
andorinhas furam a paisagem
bicos, bicos, pontas de asas
a curva rasante de um voo
de encontro ao invisível
abismo
 
Jane Sprenger Bodnar, Curitiba, PR


terça-feira, 26 de novembro de 2013

Brincando com meu gato














Meu gato.
Te vi na televisão.
Camisa branca, calça jeans, sorriso imenso.
Falou, absurdo: escrevo pra ela me ler.  
Ela eu, perguntei para os meus botões já aos risos.
E tu repetiste diante das câmeras: é, escrevo pra ela me ler.
E eu ronronei  satisfeita por te ter tão ímpar.

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Do diário de meu tio




Passei em frente à casa de Marina. Gosto de ver aquela casa, tem um jeito que chama a gente. O jeito de Marina. Entrei lá duas ou três vezes, joguei botão com o irmão dela que mudou pra Recife e uma vez tomei lanche com eles. Depois de terminar o namoro com Marina às vezes passava lá, na esperança de vê-la na varanda como naquele dia. Mesmo contra toda lógica, teimo em pensar que isso seria como um sinal de que tudo podia recomeçar.
O cheiro que vinha da casa era uma viagem. Pão doce, cheiro de pão doce fresquinho, novo, dourado. Imaginei a mesa posta, o aipim desmanchando na boca, a manteiga derretida por cima e aquela cobertura morena de canela e açúcar. Pãozinho francês estalando dentro da cesta de vime com o paninho de crochê de bico, branquinho e engomado de leve. A manteigueira, o açucareiro, o bule do café e a leiteira do jogo branco e azul. Os queijos, sempre três ou quatro, o presunto rosado e tenrinho, o requeijão cremoso, fresco, delicioso. O pote do mel de laranjeira, e na tigela branca os sequilhos, biscoitinhos de nata, ao lado do vidro bojudo das torradas e do outro, da geléia. Três ou quatro sucos naturais, um doce de goiaba, outro de leite; o bolo de milho no prato de pé.
Altíssimo astral junto à janela de vidro aberta para o pôr-do-sol e as montanhas azuladas. A mesa coberta pela toalha leve de xadrez miudinho e claro, recendendo a capim-cheiroso; os guardanapos bordados de florinhas e as xícaras azuis.
(Silêncio reverente, suspiro calado, profundo mergulho no âmago do ser.)
As margaridas no canteiro da cerca lá fora e gerânios na jardineira sobre o muro que esconde a área de serviço.
Daria muito por esse momento. Mas não fico muito tempo diante da casa. Tenho medo de que meu desejo se realize e ela apareça na varanda, caso em que eu seria bem capaz de perder a cabeça e voltar com ela, mesmo sabendo o que viria depois. Porque é verdade que seria capaz de dar quase tudo por esse momento. Menos a liberdade.

A moça

Arruma os livros, ajeita as flores do vaso, enfileira feito soldados a coleção de bonecos vindos dos quatro cantos redondos do mundo. 
Tira o pó dos porta-retratos, areja os álbuns e digitaliza imagens enquanto reduz a 3x4 as cenas do passado. Festas, mares, vulcões, amigos, copos de leite, de cólera e de vinho. 
Prende os cabelos em um nó, estica os braços pra cima, alonga os músculos, dá a função por encerrada e caminha até a cozinha.
Guarda as toalhas, os guardanapos, arranha um dedo com uma faca e, sem querer, derruba o par de xícaras do primeiro café bebido entre as paredes coloridas da casa antiga.
Vai para o quarto, senta na cama, empurra as pilhas de roupas um pouco pro lado e acaricia a colcha perfumada de alecrim. 
Acaricia a colcha, as coxas e o contorno dos seios. 
Sente o suor, o transbordamento e as pulsões do corpo. Sente a mente diluindo a poeira incrustada de rancores. 
Sente a mente, a matéria e o abandono deixando a memória, deixando-a voltar-se para o futuro em direção à calma e ao descanso de um merecido travesseiro.

domingo, 17 de novembro de 2013

A visita

 
 
 
Como faço todas as tardes, tomei um banho, botei um vestido bem leve, me maquiei, passei perfume, ajeitei os cabelos com gel, fui até a sala, chamei um taxi, descí no elevador, cumprimentei o porteiro, peguei o taxi; dei a volta no quarteirão, saltei, tornei a cumprimentar o porteiro, subí no elevador, parei em frente à porta e toquei a campaínha.
Ninguém abriu. Insistí, uma, duas, três, quatro vezes.
 Nada. Não adianta. Não estou. E fico aqui parada, diante da porta, na dúvida: deixo um bilhete para mim?
 
 
Haiconto de Alice Barreira, Barura(Amapá)
 extraído de http://cesarcar.blogspot.com/

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Para refletir...

Francis Picabia
 
Autores são atores. Livros são teatros.
 
Jogue fora as luzes, as definições. Diga o que você vê na escuridão.
 
Wallace Stevens, Pensilvânia(EUA) - 1879-1955


sábado, 9 de novembro de 2013

De Paul Valéry

No poeta:
A orelha fala,
A boca escuta:
É a inteligência, o despertar, quem procria e sonha;
É o sonho quem vê claro;
É a imagem e o fantasma quem olha,
É a falta e a lacuna quem cria.
 
 
 
A ideia de Inspiração contém:
O que nada custa é o que tem maior valor.
O que tem maior valor nada deve custar.
E também:
Glorifica-se o máximo aquilo do que menos responsável se é.
 
Litérature,  1929

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

improviso (para imagem de Usha Tsonkova)


















“Nas coisas conhecidas
  o verbo ser
    emudece”
em o eco de mil sinos de prata, Ana Hatherly



vertido o resíduo do verbo
na estria  nascente
do dia,

no braço do rio
no sobejo, no excesso tardio
do corpo imaginário,
a bagagem, nós

e da sombra
[tão ténue a linha excedente da margem]
e na margem, a voz

e da voz
que sobra resíduo

as coisas conhecidas
que aguardam no corpo
na forma de semente
vertigem, a  voz

e do cio da voz,
no braço do rio, na estria nascente
[tão inquieta, quase gente]
a silenciosa aprendizagem do norte

a nuvem da ténue asa breve
o fim.


Novembro 2013, 6



[nota: por desafio de Tania Contreiras, improviso para imagem de Usha Tsonkova.
Um grato e imenso abraço, Tania!]

terça-feira, 5 de novembro de 2013

Teoria das cores

 
 

Era uma vez um pintor que tinha um aquário com um peixe vermelho. Vivia o peixe tranquilamente acompanhado pela sua cor vermelha até que principiou a tornar-se negro a partir de dentro, um nó preto atrás da cor encarnada. O nó desenvolvia-se alastrando e tomando conta de todo o peixe. Por fora do aquário o pintor assistia surpreendido à chegada do novo peixe.

O problema do artista era que, obrigado a interromper o quadro onde estava a chegar o vermelho do peixe, não sabia o que fazer da cor preta que ele agora lhe ensinava. Os elementos do problema constituíam-se na observação dos factos e punham-se por esta ordem: peixe, vermelho, pintor - sendo o vermelho o nexo entre o peixe e o quadro, através do pintor. O preto formava a insídia do real e abria um abismo na primitiva fidelidade do pintor.

Ao meditar sobre as razões da mudança exactamente quando assentava na sua fidelidade, o pintor supôs que o peixe, efectuando um número de mágica, mostrava que existia apenas uma lei abrangendo tanto o mundo das coisas como o da imaginação. Era a lei da metamorfose.

Compreendida esta espécie de fidelidade, o artista pintou um peixe amarelo.


Herberto Helder, em Os passos em volta - Assírio e Alvim, Lisboa, 2001

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Ilusões da vida

Cécile Hesse
 
Quem passou pela vida
em branca nuvem
E em plácido repouso adormeceu,
Quem não sentiu o frio da desgraça,
Quem passou pela vida e não sofreu
Foi espectro de Homem - não foi Homem.
Só passou pela vida - não viveu.
 
Francisco Otaviano, Rio de Janeiro (1825-1889)


sábado, 2 de novembro de 2013

Ânsia


 
Não me deixem tranquilo
não me guardem sossego
eu quero a ânsia da onda
o eterno rebentar da espuma
 
As horas são-me escassas
dai-me o tempo
ainda que não o mereça
que eu quero ter outra vez
idades que nunca tive
para ser sempre
eu e a vida
nesta dança desconcentrada
como se de corpos
tivéssemos trocado
para morrer vivendo
 
 
Mia Couto


quinta-feira, 31 de outubro de 2013

FELIZ ANIVERSÁRIO, Tânia !!!!


 

Querida Tânia, nós do 'Mínimo" te desejamos muitas alegrias e o Máximo de Poesia e Amor na continuação de tua vida! Beijos, beijos, beijosssss

Deixo para ti um trecho do poema Mãos dadas, de Carlos Drummond de Andrade, que também faria aniversário hoje:

[...]


Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,
não direi os suspiros ao amanhecer, a paisagem vista da janela,
não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicidas,
não fugirei para as ilhas, nem serei raptado por serafins.
O tempo é a minha matéria, o tempo presente,
os homens presentes,
a vida presente.


segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Tanta beleza


Lou Reed: 1942–2013


Ontem, ao 71 anos de idade, faleceu o cantor, compositor e guitarrista norte-americano Lou Reed, um daqueles artistas que podia ser apelidado simplesmente de lenda viva da música rock.
Com algumas excepções pontuais, sempre gostei mais do trabalho de Lou Reed nos The Velvet Underground do que da sua carreira a solo. Do icónico «disco da banana» (como ficou conhecido) com a participação de Nico, destaco I'll Be Your Mirror, uma canção perfeita. Um excerto da letra:

          When you think the night has seen your mind
          That inside you're twisted and unkind
          Let me stand to show that you are blind
          Please put down your hands
          'Cause I see you

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Em meu Ofício ou Arte Taciturna

  Francis Bacon

 
Em meu ofício ou arte taciturna
Exercido na noite silenciosa
Quando somente a lua se enfurece
E os amantes jazem no leito
 
Com todas as suas mágoas nos braços,
Trabalho junto à luz que canta
Não por glória ou por pão
Nem por pompa ou tráfico de encantos
 
Nos palcos de marfim
Mas pelo mínimo salário
De seu mais secreto coração.
Escrevo estas páginas de espuma
 
Não para o homem orgulhoso
Que se afasta da lua enfurecida
Nem para os mortos de alta estirpe
Com seus salmos e rouxinóis,
 
Mas para os amantes, seus braços
Que enlaçam as dores dos séculos,
Que não me pagam nem me elogiam
E ignoram meu ofício ou minha arte.


Dylan Thomas, País de Gales - 1914-1953
 
 


Regresso a Sísifo

Max Klinger, 1914
 
 
Rolo a pedra e outra vez como antes
a empurrarei, a empurrarei ladeira acima
para vê-la rolar de novo.
Começa a batalha que aconteceu mil vezes
contra apedra e Sísifo e eu mesmo.
 
Pedra que nunca deterás no alto:
dou-te as graças por rolar ladeira abaixo.
Sem este drama inútil, a vida seria inútil.
 
José Emílio Pacheco, México.


sábado, 19 de outubro de 2013

Você não vale nada, mas eu gosto de você!?



"A ema gemeu...." !?


Vinicius de Moraes (10)


Para finalizar esta série, uma escolha um pouco diferente: Por causa de você. Tom Jobim havia composto a melodia desta canção, e Vinicius iria escrever a letra. Entretanto, Jobim mostrou a melodia a Dolores Duran, tendo esta, de imediato, escrito uma letra. Quando Vinicius viu a letra, considerou-a superior à sua, preferindo-a. 
Mesmo não sendo uma canção de Vinicius (nota: há quem diga que este deu o seu contributo na composição da música), é incontornável como testemunho da generosidade e da humildade de Vinicius.

Vinicius de Moraes (9)


Voltamos a Elis Regina (como não?!), desta feita acompanhada por César Camargo Mariano numa sentida interpretação de Modinha, mais uma canção da dupla Vinicius/Jobim.

A "genialidade" de Aladim no século XXI !

 
Era uma vez uma mulher que caminhava despreocupadamente pelas ruas de uma grande cidade brasileira e defrontou-se com a Lâmpada de Aladim. Passados os primeiros segundos de surpresa, ela a tocou, e como era esperado, dela saiu um Gênio. Imediatamente, a mulher foi fazendo seus pedidos:
 
- quero que eu seja a única para o meu marido;
- que ele tome o café da manhã, que almoce, jante, e durma sempre ao meu lado;
- que me toque logo que acordar;
- que não me deixe nem quando for ao banheiro:
- que viaje sempre comigo;
- que cuide de mim e me contemple;
- que nunca me deixe sozinha e me leve com ele para todos os lugares.
 
E então, ZÁS.....!!!
O Gênio a transformou num
CELULAR !!!!