Passei em frente à casa de Marina. Gosto
de ver aquela casa, tem um jeito que chama a gente. O jeito de Marina. Entrei
lá duas ou três vezes, joguei botão com o irmão dela que mudou pra Recife e uma
vez tomei lanche com eles. Depois de terminar o namoro com Marina às vezes
passava lá, na esperança de vê-la na varanda como naquele dia. Mesmo contra
toda lógica, teimo em pensar que isso seria como um sinal de que tudo podia
recomeçar.
O cheiro que vinha da casa era uma
viagem. Pão doce, cheiro de pão doce fresquinho, novo, dourado. Imaginei a mesa
posta, o aipim desmanchando na boca, a manteiga derretida por cima e aquela
cobertura morena de canela e açúcar. Pãozinho francês estalando dentro da cesta
de vime com o paninho de crochê de bico, branquinho e engomado de leve. A
manteigueira, o açucareiro, o bule do café e a leiteira do jogo branco e azul.
Os queijos, sempre três ou quatro, o presunto rosado e tenrinho, o requeijão
cremoso, fresco, delicioso. O pote do mel de laranjeira, e na tigela branca os
sequilhos, biscoitinhos de nata, ao lado do vidro bojudo das torradas e do
outro, da geléia. Três ou quatro sucos naturais, um doce de goiaba, outro de
leite; o bolo de milho no prato de pé.
Altíssimo astral junto à janela de vidro
aberta para o pôr-do-sol e as montanhas azuladas. A mesa coberta pela toalha
leve de xadrez miudinho e claro, recendendo a capim-cheiroso; os guardanapos
bordados de florinhas e as xícaras azuis.
(Silêncio reverente, suspiro calado,
profundo mergulho no âmago do ser.)
As margaridas no canteiro da cerca lá
fora e gerânios na jardineira sobre o muro que esconde a área de serviço.
Daria muito por
esse momento. Mas não fico muito tempo diante da casa. Tenho medo de que meu
desejo se realize e ela apareça na varanda, caso em que eu seria bem capaz de
perder a cabeça e voltar com ela, mesmo sabendo o que viria depois. Porque é
verdade que seria capaz de dar quase tudo por esse momento. Menos a liberdade.
Ah
ResponderExcluirA liberdade de amar
e se libertar
Abs
Epa! que delícia de narrativa. E, claro, abriu o apetite. E essa Marina, se ela soubesse...
ResponderExcluirbeijo, Dade!