A CLASSE OPERÁRIA VAI AO MUSEU
Antonio Luiz Nilo
Diretor de Criação da Objectiva Comunicação
Acaba de ser inaugurada no Masp a exposição Luzes do Norte que reúne desenhos e gravuras do Renascimento alemão, obras que pertencem ao acervo do Museu do Louvre. Sim, mas... e daí?
Muitos diriam que esse é o tipo de notícia que só interessaria à crítica especializada ou ao insignificante nicho intelectual brasileiro. Ledo engano. O Brasil se tornou, nesses últimos anos, um dos maiores centros expositores do mundo, trazendo, com uma frequencia cada vez maior, obras de mestres como Caravaggio, Escher e Modigliani para as principais capitais do país.
O CCBB no Rio de Janeiro, por exemplo, tem hoje a 18 maior audiencia de arte do planeta, com 2,8 milhões de visitantes/ano. E a cidade já é comparada a Paris, Tóquio e Nova York no cenário artístico mundial. Capitais como São Paulo, Brasília e Porto Alegre também se destacam como promotoras de grandes exposições.
E Salvador? Em Salvador, como todos sabem, o buraco é mais embaixo. E mais profundo. Aqui, excetuando a exposição de Rodin, que para os moldes baianos teve até uma boa repercussão, as artes plásticas ainda engatinham e sujam fraldas... assim como a música, o cinema e a literatura. Alguns reagiriam falando que, na verdade, quem não consome a cultura é o povão.
Ok, sou até da opinião que o povão tem limitações em qualquer lugar do mundo, basta observar o estrondoso sucesso de Paulo Coelho na França. Mas, na Bahia, a doença parece ser mais crítica. Aqui até a classe média alta, pretenso reduto da intelectualidade, cultiva hábitos, diríamos, culturalmente pouco saudáveis. O sucesso da literatura, por exemplo, não escapa da lista dos "10 mais" de autoajuda da Veja. O cinema, pièce de résistance da gastronomia cultural baiana, só consegue engordar as bilheterias de Mercenários e Crepúsculos. A música... bom, sobre música, é melhor a gente nem falar.
Mas esqueçamos Salvador como exceção e voltemos ao tema. As exposições artísticas estão sendo cada vez mais consumidas no país. E isso se deve à boa fase da economia brasileira, à Rouanet e à ascensão da classe C. Isso mesmo, a classe C descobriu que pode, sim, ter acesso às grandes exposições artísticas e finalmente compreender esse universo até então inalcançável. O tema começa a ser explorado por um público que não pertence nem à classe realmente intelectualizada. capaz de decifrar os textos incompreensíveis dos críticos de arte, nem à classe de alto poder aquisitivo, que emburrece galopantemente.
Essa nova classe economicamente ativa pode ter um novo olhar para a arte. Um olhar autêntico. Sem compromisso. Afinal, um quadro é para ser admirado. A técnica, o estilo ou a escola podem não ser assim tão importantes para uma apreciação legítima, honesta. Quem sabe a classe "C" não se transforme, daqui a alguns anos, na classe "Cultural" brasileira. Quem sabe?