A rosa vermelha amarrada ao pé do louco é uma
imagem que não me sai da cabeça, faz tempo. O homem negro, nu, chegou com a
pele brilhante, o riso esboçado, completamente alheio à paisagem em sua volta.
Todos os olhares convergiram para a sua nudez, e o louco caminhava firme,
indiferente ao alvoroço que provocava nas dezenas de pessoas na praia.
Sem ter superado de todo o meu
fascínio pela loucura, observei atenta cada passo marcado do homem, que vinha
agora quase em minha direção. Uma marcha para a frente, e lá estava ele diante
de mim, mirando o mar. Observei no seu tornozelo esquerdo uma rosa vermelha
presa com um cordão encardido, sua única indumentária. O homem louco ornava-se
antes do caminhar incerto e engendrava delicadezas antes de sair errante, até
dar no mar, com deslumbramento de criança.
Sem tirar os olhos do homem,
pensei na beleza que tinge suavemente a loucura. No poder da poesia que
enrubrece a insanidade sem cor. Refleti sobre as pontes que se fazem entre as
águas bravias do inconsciente e a árida lucidez dos que jamais enlouquecem.
Entendi que o homem, louco, se cobria com a veste mais íntima do seu delírio; e
com sua demência amparava a fragilidade da flor.
Inclinando parcialmente o corpo e
levantando a perna esquerda, o louco desatou o nó da corda encardida e deitou
com maciez a rosa sobre a areia. Sorrindo para o nada, caminhou em direção ao
mar e atirou-se com felicidade às águas que pareciam esperar-lhe. Antes mesmo
do primeiro mergulho, dois salva-vidas saltaram sobre o homem, que continuava a
sorrir, trazendo-o de volta à areia, agora seguro pelos dois braços.
Já em terra, o homem apanhou o
cordão encardido, ajeitou suavemente a rosa vermelha no tornozelo, e saiu
andando com um sorriso matreiro na direção da rua.
Taninha!!
ResponderExcluirQue conto!
Parabéns :)
Beijosss
Um acontecimento real, Lelena. Postei faz tempo no Roxo. Eu presenciei isso.
ResponderExcluirBeijos,
Tânia!
ResponderExcluirUm texto de tirar o fôlego. Há uma intensa luz de beleza no homem louco. Não sei se pela pureza, pela rosa, pelas águas à sua espera, mas sei que tudo é absurdamente belo!
Parabéns!
Beijos
Mirze
Nunca esqueci as feições dele, o sorriso, a rosa, Mirze...Beijos
ExcluirTania,
ResponderExcluirJá se perguntou quantas vezes o louco já nos olhou sem a rosa no tornozelo dando-se conta da nossa loucura? Porque o louco é sempre o outro.
Uma beleza a transfiguração do real que você nos deu. Parabéns!
José Carlos
A loucura sempre foi um tema que me instigou, José Carlos...Sim, loucos sem rosas evidenciam a nossa própria loucura...
ExcluirBjos,
Um texto interesante e que nos leva a pensar.Em nossos irmãos de rua (um exemplo)se todos nós ao encontrar um ou ele vier ao nosso encontro devemos ter a mesma sensibilidade que vc teve Tania com certeza teriamos um mundo menos injusto,ja fiz esta experiencia, e achando que ia ensinar acabei aprendendo..parabéns pelo texto e obrigado por dividir comigo esta passagem,bjs no teu coração
ResponderExcluirGAGAU
Beijo, Gagau e obrigada pela leitura. Sim, na rua há muitos irmãos nossos, mal os olhamos, quase nunca enxergamos..
ExcluirMuito bom Mesmo!
ResponderExcluirObrigada pela leitura, Duda! :-)
Excluirbeijos,
Gostei mesmo muito! Algo real e empolgante ;)
ResponderExcluirBom resto de fim de semana
Bom domingo pra ti e obrigada pela leitura...
ExcluirBeijos,
Lindo este Elogio a Loucura!
ResponderExcluirA loucura às vezes nos cura! :-) Beijo e obrigada pela leitura (rimou! rs)
ExcluirA tua narrativa é tão real, tão bem escrita que ví-me nessa praia
ResponderExcluirno mesmo dia que o viste! Não tive nenhuma dúvida quanto a veracidade do acontecido, embora a sociedade em geral "prefira" ver a loucura como ficção, como algo que não faça parte de si mesma.
PARABÉNS pela beleza e pela tua sensibilidade!!!
beijosss
Verdade, Ci, de algum modo ainda existem as naus dos loucos, a gente prefere vê-los longe. Tua leitura é sempre um presente, viu? :-)
ExcluirBeijos
Tânia gostei muito do conto para lembrar que dentro do caos, da loucura - existe sempre um equilíbrio, uma cura.
ResponderExcluirbeijos
Aceite uma flor, Tânia.
ResponderExcluir;)
Um beijo, amiga.