encosta o teu ouvido neste pedaço de terra
húmida que te trago dum país distante, neste grão de terra, neste pedaço de
alma como se fora a gota menos saliente da tua. Recolhe o teu espírito neste
pedaço de barro dos barros como se fora o grão que construiu o mundo, a amostra
que o Filósofo Improvável tomou entre as mãos, sabendo que daí tornaria
possível construir esta terra de sangues e dores em seis dias apenas, e do
barro ao espírito, das cinzas à alma, na terra onde descansou, escuta
encosta suavemente nas minhas mãos os teus
olhos, repara, escuta como gemem as dores dos vivos os murmúrios serenos de
quem desceu ao profundo das águas placentas para aí depositar o seu sangue, o
seu corpo dorido dos dias agora repousando na imensidão do silêncio. E dos
passos que se ouvem pisando a terra que não nos pertence, das lágrimas que
descem suavemente como recados de clemência, do perdão a quem pariu o mundo,
não sem muito das dores tomadas por suas, escuta
escuta este lugar onde as palavras não têm sombras,
o tempo não separa nem significa nada, onde o tempo não planeja, não se move,
não se entrega, onde o tempo não significa nada. É apenas um grão de terra, uma
gota de água, uma réstia de ar, um castelo de memórias, uma montanha que se
separou do tempo, uma gruta funda como o mundo onde se guardam os arquivos que
teimam permanecer prisioneiros do passado, aqui e ali um sorriso, guardados nas
toscas tábuas onde se guardam o que restará do teu, do meu corpo, engavetados
nesta terra húmida que pertence a um país distante, a um plano sem ponto de
fuga, a uma ardósia que o manto verde do musgo tapará a seu tempo, quando o
tempo se separar do tempo e estes nossos corações, de coisa nenhuma
e então, escuta.
e então, escuta.
[Outubro 2009]
[breve aparte: este texto (apenas parte dum mais longo) aparece aqui ligeiramente alterado por um motivo em especial: ao escolher “uma palavra” para o desafio da Fundação José Saramago, 90 anos 90 palavras, assim o tive por bem… “amputar”, resultando neste mais breve, a palavra número dezassete, que também se encontra em Fund. José Saramago.]
[breve aparte: este texto (apenas parte dum mais longo) aparece aqui ligeiramente alterado por um motivo em especial: ao escolher “uma palavra” para o desafio da Fundação José Saramago, 90 anos 90 palavras, assim o tive por bem… “amputar”, resultando neste mais breve, a palavra número dezassete, que também se encontra em Fund. José Saramago.]
quero esses ouvidos perfeitos de silêncio...
ResponderExcluirbeijoss
BF ou Lelena :)