quarta-feira, 21 de novembro de 2012

As peregrinações de um poema


O poema é solitário
Paul Célan
Desenho de Ana Hatherly





O pequeno gesto de um poema
pode abrir uma perspectiva infinita?
Quantas vezes será preciso
bater com a cabeça
para vislumbrar a graça original?
Tudo o que podemos não podemos
Tudo o que fazemos não o fazemos sós
A palavra é um duro muro:
não se move a suplicantes rogos
O poema isola o poeta
afirma-se à margem de si próprio
 
***
 
Os poemas são uma peregrinação
uma crença
que impele o poeta ao corpo a corpo
com o abismo que o cerca
A batalha é infinita
assenta no interesse do acaso
do ocaso
dos infinitos mortos
em cujos ombros subimos
incansáveis
Qual é o prazer do caminhante
senão
o de encontrar a invisível ponte
a ambição de ousar?
A nostalgia é um erro da paixão
O poema é um rio de vozes (grifo meu).

 
Ana Hatherly, Porto (1929- ), em O pavão negro, 2003.


10 comentários:

  1. Respostas
    1. Sentí a leveza de teu sopro, Mar Arável, obrigada pela
      suavidade do voo!

      nos ares :)

      Excluir
  2. Olá gostei muito do seu blog e já aderi!
    Se quiser visitar o meu espaço e espreitar o k escrevo aqui fica o endereço!

    http://lualibra.blogspot.pt/

    Sarah

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Sarah, obrigada pela visita e pela adesão. O blog é uma criação coletiva, seja bem vinda!

      um abraço

      Excluir
  3. Respostas
    1. Que bom que você gostou, Sílvia.
      Obrigada pela visita!

      beijo

      Excluir
  4. Ci, ah! As tuas escolhas! Ana Hatherly é maravilhosa.
    Parabéns por fazer uma "ciranda" com poemas que refletem sobre a própria escrita.

    Deixo outro de Eugénio de Andrade:

    HAVIA

    Havia
    uma palavra
    no escuro.
    Minúscula. Ignorada.

    Martelava no escuro.
    martelava
    no chão da água.

    Do fundo do tempo,
    martelava.
    Contra o muro.

    Uma palavra.
    No escuro.
    Que me chamava.

    beijo,

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Incrível, José Carlos!
      Eugênio de Andrade também é maravilhoso!
      Ah, esses poetas! Me deixam louca, doidinha pra escutar
      também o som desse martelo :))

      obrigada!

      um beijo

      Excluir
  5. Respostas
    1. E então, Dade. Você faz parte dessa beleza sem fim!!!

      um beijo

      Excluir