sábado, 29 de março de 2014

POSSE





Nos compêndios escolares não se falava da pequena ilha
solitária e perdida nos mares do Sul.
Não passavam por lá os barcos dos brancos
e o povo seguia a sua própria lei
que no entanto não estava escrita em livro algum.
Homens e mulheres viviam nus e amavam-se sem complicações
e comiam peixes que pescavam em canoas feitas com troncos de árvores
e carne de animais caçados com setas certeiras.
 
Atletas e guerreiros dançavam ao som de búzios e tambores
e as bailadeiras ondeavam contorcidos ritmos lentos
na toada triste de instrumentos de uma só corda.
E tinham seus deuses, seus santos, seus sacerdotes, seus feiticeiros,
e moravam em cubatas cobertas com palmas das palmeiras.
 
Mas do outro lado da terra
um dia
senhores de cara grave assentaram-se à volta de uma mesa com mapas em frente,
 
falando de guerras,
de bases para aviões,
de pontos estratégicos
.
Então veio à baila a ilha solitária perdida nos mares do Sul...
Semanas depois um barco de ferro chegou e fundeou
nas águas tranquilas da baía...
E um escaler veio para terra com homens loiros vestidos de branco,
trazendo, entre outras coisas,
uma bandeira para a primeira afirmação imperial,
um chicote para o primeiro castigo,
um barril de pólvora para o primeiro massacre
e um outro de álcool para o primeiro comércio!
 
Jorge Barbosa (Cabo Verde)
 

Um comentário:

  1. Una preciosa historia que nos habla del sometimiento de los pueblos, de cómo los que nos llamamos "civilizados" aplastamos culturas, contaminamos ríos, tierras y mentes para cambiar el valor de la vida por el "valor" del dinero.

    Un saludo desde Madrid, España. Me encanta practicar un poco con la lectura en portugués.

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