Meus queridos do Mínimo Ajuste. Estava lendo Veríssimo e deparei com um Texto do Jabor. As duas leituras entrelaçaram-se perfeitamente. Para refletir e meditar.
QUERO VOLTAR A CONFIAR.
Fui criado com princípios morais comuns: quando eu era pequeno, mães, pais, professores, avós, tios, vizinhos eram autoridades dignas de respeito e consideração.
Quanto mais próximos ou mais velhos, mais afeto.
Inimaginável responder de forma mal educada aos mais velhos, professores ou autoridades… Confiávamos nos adultos porque todos eram pais, mães ou familiares das crianças da nossa rua, do bairro, ou da cidade…
Tínhamos medo apenas do escuro, dos sapos, dos filmes de terror…
Hoje me deu uma tristeza infinita por tudo aquilo que perdemos.
Por tudo o que meus netos um dia enfrentarão.
Pelo medo no olhar das crianças, dos jovens, dos velhos e dos adultos.
Direitos humanos para criminosos, deveres ilimitados para cidadãos honestos.
Não levar vantagem em tudo significa ser idiota.
Pagar dívidas em dia é ser tonto…
Anistia para corruptos e sonegadores…
O que aconteceu conosco?
Professores maltratados nas salas de aula, comerciantes ameaçados por traficantes, grades em nossas janelas e portas.
Que valores são esses?
Automóveis que valem mais que abraços, filhas querendo uma cirurgia como presente por passar de ano. Celulares nas mochilas de crianças.
O que vais querer em troca de um abraço?
A diversão vale mais que um diploma.
Uma tela gigante vale mais que uma boa conversa.
Mais vale uma maquiagem que um sorvete.
Mais vale parecer do que ser…
Quando foi que tudo desapareceu ou se tornou ridículo?
Quero arrancar as grades da minha janela para poder tocar as flores! Quero me sentar na varanda e dormir com a porta aberta nas noites de verão!
Quero a honestidade como motivo de orgulho.
Quero a retidão de caráter, a cara limpa e o olhar olho-no-olho.
Quero a vergonha na cara e a solidariedade.
Quero a esperança, a alegria, a confiança!
Quero calar a boca de quem diz: "temos que estar ao nível de…", ao falar de uma pessoa.
Abaixo o "TER", viva o "SER" e definitivamente bela, como cada amanhecer. E viva o retorno da verdadeira vida, simples como a chuva, limpa como o céu de primavera, leve como a brisa da manhã!
Quero ter de volta o meu mundo simples e comum.
Vamos voltar a ser "gente" onde existam amor, solidariedade e fraternidade como bases.
A indignação diante da falta de ética, de moral, de respeito... Construir um mundo melhor, mais justo, mais humano, onde as pessoas respeitem as pessoas.
Utopia?
Quem sabe?...
Precisamos tentar…
Quem sabe começando a encaminhar ou transmitindo essa mensagem…
Nossos filhos merecem e nossos netos certamente nos agradecerão!
Arnaldo Jabor
COMENTÁRIO: Assim como diz o texto de Arnaldo Jabor, eu quero voltar a confiar, a acreditar ... Realmente, o ser humano está cada vez mais perdendo a sua essência. Enquanto o mundo está na corrida para se modernizar, as coisas mais belas e simples estão sendo deixadas de lado. Cabe a nós tentarmos recuperar o que há de bom através da História e da Educação, para ver se assim, quem sabe, o futuro do nosso país e quem sabe do mundo seja melhor. Não custa nada tentar!
QUEM SOU EU?
Nesta altura da vida já não sei mais quem sou... Vejam só que dilema!!!
Na ficha da loja sou CLIENTE, no restaurante FREGUÊS, quando alugo uma casa INQUILINO, na condução PASSAGEIRO, nos correios REMETENTE, no supermercado CONSUMIDOR. Para a Receita Federal CONTRIBUINTE, se vendo algo importado CONTRABANDISTA. Se revendo algo, sou MUAMBEIRO, se o carnê tá com o prazo vencido INADIMPLENTE, se não pago imposto SONEGADOR. Para votar ELEITOR, mas em comícios MASSA , em viagens TURISTA , na rua caminhando PEDESTRE, se sou atropelado ACIDENTADO, no hospital PACIENTE. Nos jornais viro VÍTIMA, se compro um livro LEITOR, se ouço rádio OUVINTE. Para o Ibope ESPECTADOR, para apresentador de televisão TELESPECTADOR, no campo de futebol TORCEDOR. Se sou corintiano, SOFREDOR. Agora, já virei GALERA. (se trabalho na ANATEL , sou COLABORADOR ) e, quando morrer... uns dirão... FINADO, outros... DEFUNTO, para outros... EXTINTO , para o povão... PRESUNTO... E o pior de tudo é que para todo governante sou apenas um IMBECIL !!! E pensar que um dia já fui mais EU.
Luiz Fernando Veríssimo.
Com amor e carinho,
Sílvia
quarta-feira, 30 de junho de 2010
O Barqueiro faz aniversário
Aniversaria amanhã, 1º de julho, um grande Poeta. Poeta de córregos, enchentes e mares...Poeta de ventos, nuvens, aves e asas...Poeta de terra, raízes, arreia escorrendo pela ampulheta....Poeta de encontros, desencontros, ruínas e abraços do lado esquerdo do peito.
Sempre encontro em seus versos os três elementos (terra, água e ar)...e adivinho que o quarto elemento, o fogo, brota do coração do poeta.
Parabéns, Leonardo B, nosso barqueiro que nos leva de uma margem a outra de nós mesmos: esse grande presente!
Sempre encontro em seus versos os três elementos (terra, água e ar)...e adivinho que o quarto elemento, o fogo, brota do coração do poeta.
Parabéns, Leonardo B, nosso barqueiro que nos leva de uma margem a outra de nós mesmos: esse grande presente!
REFLEXOS
Como sempre uma dança lenta,
Olhando-se no fundo dos olhos rasos de água.
Reflectiram-se, como só dois apaixonados sabem fazer.
E o dia foi amanhecendo...
GED
Olhando-se no fundo dos olhos rasos de água.
Reflectiram-se, como só dois apaixonados sabem fazer.
E o dia foi amanhecendo...
GED
A LINGUA
Já aqui trocamos algumas impressões sobre linguas vivas e mortas e sobre acordos ortográficos.
Fica aqui a opinião de Mia Couto. E, volto a dizer: que se danem os puristas.
Venho brincar aqui no Português, a língua. Não aquela que outros embandeiram. Mas a língua nossa, essa que dá gosto a gente namorar e que nos faz a nós, moçambicanos, ficarmos mais Moçambique. Que outros pretendam cavalgar o assunto para fins de cadeira e poleiro pouco me acarreta.
A língua que eu quero é essa que perde função e se torna carícia. O que me apronta é o simples gosto da palavra, o mesmo que a asa sente aquando o voo. Meu desejo é desalisar a linguagem, colocando nela as quantas dimensões da Vida. E quantas são? Se a Vida tem é idimensões? Assim, embarco nesse gozo de ver como escrita e o mundo mutuamente se desobedecem. Meu anjo-da-guarda, felizmente, nunca me guardou.
Uns nos acalentam: que nós estamos a sustentar maiores territórios da lusofonia. Nós estamos simplesmente ocupados a sermos. Outros nos acusam: nós estamos a desgastar a língua. Nos falta domínio, carecemos de técnica. Ora qual é a nossa elegância? Nenhuma, excepto a de irmos ajeitando o pé a um novo chão. Ou estaremos convidando o chão ao molde do pé? Questões que dariam para muita conferência, papelosas comunicações. Mas nós, aqui na mais meridional esquina do Sul, estamos exercendo é a ciência de sobreviver. Nós estamos deitando molho sobre pouca farinha a ver se o milagre dos pães se repete na periferia do mundo, neste sulbúrbio.
No enquanto, defendemos o direito de não saber, o gosto de saborear ignorâncias. Entretanto, vamos criando uma língua apta para o futuro, veloz como a palmeira, que dança todas as brisas sem deslocar seu chão. Língua artesanal, plástica, fugidia a gramáticas.
Esta obra de reinvenção não é operação exclusiva dos escritores e linguistas. Recriamos a língua na medida em que somos capazes de produzir um pensamento novo, um pensamento nosso. O idioma, afinal, o que é senão o ovo das galinhas de ouro?
Estamos, sim, amando o indomesticável, aderindo ao invisível, procurando os outros tempos deste tempo. Precisamos, sim, de senso incomum. Pois, das leis da língua, alguém sabe as certezas delas? Ponho as minhas irreticências. Veja-se, num sumário exemplo, perguntas que se podem colocar à língua:
Se pode dizer de um careca que tenha couro cabeludo?
No caso de alguém dormir com homem de raça branca é então que se aplica a expressão: passar a noite em branco?
• A diferença entre um ás no volante ou um asno volante é apenas de ordem fonética?
• O mato desconhecido é que é o anonimato?
• O pequeno viaduto é um abreviaduto?
• Como é que o mecânico faz amor? Mecanicamente.
• Quem vive numa encruzilhada é um encruzilhéu?
• Se diz do brado de bicho que não dispõe de vértebras: o invertebrado?
• Tristeza do boi vem de ele não se lembrar que bicho foi na última reencarnação. Pois se ele, em anterior vida, beneficiou de chifre o que está ocorrendo não é uma reencornação?
• O elefante que nunca viu mar, sempre vivendo no rio: devia ter marfim ou riofim?
• Onde se esgotou a água se deve dizer: "aquabou"?
• Não tendo sucedido em Maio mas em Março o que ele teve foi um desmaio ou um desmarço?
• Quando a paisagem é de admirar constrói-se um admiradouro?
• Mulher desdentada pode usar fio dental?
• A cascavel a quem saiu a casca fica só uma vel?
• As reservas de dinheiro são sempre finas. Será daí que vem o nome: "finanças"?
• Um tufão pequeno: um tufinho?
• O cavalo duplamente linchado é aquele que relincha?
• Em águas doces alguém se pode salpicar?
• Adulto pratica adultério. E um menor: será que pratica minoritério?
• Um viciado no jogo de bilhar pode contrair bilharziose?
• Um gordo, tipo barril, é um barrilgudo?
• Borboleta que insiste em ser ninfa: é ela a tal ninfomaníaca?
Brincadeiras, brincriações. E é coisa que não se termina. Lembro a camponesa da Zambézia. Eu falo português corta-mato, dizia. Sim, isso que ela fazia é, afinal, trabalho de todos nós. Colocámos essoutro português – o nosso português – na travessia dos matos, fizemos com que ele se descalçasse pelos atalhos da savana.
Nesse caminho lhe fomos somando colorações. Devolvemos cores que dela haviam sido desbotadas – o racionalismo trabalha que nem lixívia. Urge ainda adicionar-lhe músicas e enfeites, somar-lhe o volume da superstição e a graça da dança. É urgente recuperar brilhos antigos. Devolver a estrela ao planeta dormente.
A língua que eu quero é essa que perde função e se torna carícia. O que me apronta é o simples gosto da palavra, o mesmo que a asa sente aquando o voo. Meu desejo é desalisar a linguagem, colocando nela as quantas dimensões da Vida. E quantas são? Se a Vida tem é idimensões? Assim, embarco nesse gozo de ver como escrita e o mundo mutuamente se desobedecem. Meu anjo-da-guarda, felizmente, nunca me guardou.
Uns nos acalentam: que nós estamos a sustentar maiores territórios da lusofonia. Nós estamos simplesmente ocupados a sermos. Outros nos acusam: nós estamos a desgastar a língua. Nos falta domínio, carecemos de técnica. Ora qual é a nossa elegância? Nenhuma, excepto a de irmos ajeitando o pé a um novo chão. Ou estaremos convidando o chão ao molde do pé? Questões que dariam para muita conferência, papelosas comunicações. Mas nós, aqui na mais meridional esquina do Sul, estamos exercendo é a ciência de sobreviver. Nós estamos deitando molho sobre pouca farinha a ver se o milagre dos pães se repete na periferia do mundo, neste sulbúrbio.
No enquanto, defendemos o direito de não saber, o gosto de saborear ignorâncias. Entretanto, vamos criando uma língua apta para o futuro, veloz como a palmeira, que dança todas as brisas sem deslocar seu chão. Língua artesanal, plástica, fugidia a gramáticas.
Esta obra de reinvenção não é operação exclusiva dos escritores e linguistas. Recriamos a língua na medida em que somos capazes de produzir um pensamento novo, um pensamento nosso. O idioma, afinal, o que é senão o ovo das galinhas de ouro?
Estamos, sim, amando o indomesticável, aderindo ao invisível, procurando os outros tempos deste tempo. Precisamos, sim, de senso incomum. Pois, das leis da língua, alguém sabe as certezas delas? Ponho as minhas irreticências. Veja-se, num sumário exemplo, perguntas que se podem colocar à língua:
Se pode dizer de um careca que tenha couro cabeludo?
No caso de alguém dormir com homem de raça branca é então que se aplica a expressão: passar a noite em branco?
• A diferença entre um ás no volante ou um asno volante é apenas de ordem fonética?
• O mato desconhecido é que é o anonimato?
• O pequeno viaduto é um abreviaduto?
• Como é que o mecânico faz amor? Mecanicamente.
• Quem vive numa encruzilhada é um encruzilhéu?
• Se diz do brado de bicho que não dispõe de vértebras: o invertebrado?
• Tristeza do boi vem de ele não se lembrar que bicho foi na última reencarnação. Pois se ele, em anterior vida, beneficiou de chifre o que está ocorrendo não é uma reencornação?
• O elefante que nunca viu mar, sempre vivendo no rio: devia ter marfim ou riofim?
• Onde se esgotou a água se deve dizer: "aquabou"?
• Não tendo sucedido em Maio mas em Março o que ele teve foi um desmaio ou um desmarço?
• Quando a paisagem é de admirar constrói-se um admiradouro?
• Mulher desdentada pode usar fio dental?
• A cascavel a quem saiu a casca fica só uma vel?
• As reservas de dinheiro são sempre finas. Será daí que vem o nome: "finanças"?
• Um tufão pequeno: um tufinho?
• O cavalo duplamente linchado é aquele que relincha?
• Em águas doces alguém se pode salpicar?
• Adulto pratica adultério. E um menor: será que pratica minoritério?
• Um viciado no jogo de bilhar pode contrair bilharziose?
• Um gordo, tipo barril, é um barrilgudo?
• Borboleta que insiste em ser ninfa: é ela a tal ninfomaníaca?
Brincadeiras, brincriações. E é coisa que não se termina. Lembro a camponesa da Zambézia. Eu falo português corta-mato, dizia. Sim, isso que ela fazia é, afinal, trabalho de todos nós. Colocámos essoutro português – o nosso português – na travessia dos matos, fizemos com que ele se descalçasse pelos atalhos da savana.
Nesse caminho lhe fomos somando colorações. Devolvemos cores que dela haviam sido desbotadas – o racionalismo trabalha que nem lixívia. Urge ainda adicionar-lhe músicas e enfeites, somar-lhe o volume da superstição e a graça da dança. É urgente recuperar brilhos antigos. Devolver a estrela ao planeta dormente.
GED
terça-feira, 29 de junho de 2010
PATATIVA DO ASSARÉ
O QUE MAIS DÓI
O que mais dói não é sofrer saudade
Do amor querido que se encontra ausente,
Nem a lembrança que o coração sente
Dos belos sonhos da primeira idade
Não é também a dura crueldade
Do falso amigo, quando engana a gente,
Nem os martírios de uma dor latente,
Quando a moléstia nosso corpo invade
O que mais dói e o peito nos oprime,
E nos revolta mais do que o próprio crime,
Não é perder da posição um grau.
É ver os votos de um país inteiro,
Desde o praciano ao camponês roceiro,
Para eleger um presidente mau.
Inspiração Nordestina, Patativa do Assaré, editora hedra, SP 2006, pg 198
O que mais dói não é sofrer saudade
Do amor querido que se encontra ausente,
Nem a lembrança que o coração sente
Dos belos sonhos da primeira idade
Não é também a dura crueldade
Do falso amigo, quando engana a gente,
Nem os martírios de uma dor latente,
Quando a moléstia nosso corpo invade
O que mais dói e o peito nos oprime,
E nos revolta mais do que o próprio crime,
Não é perder da posição um grau.
É ver os votos de um país inteiro,
Desde o praciano ao camponês roceiro,
Para eleger um presidente mau.
Inspiração Nordestina, Patativa do Assaré, editora hedra, SP 2006, pg 198
Nada de mais
Chopin
MÚSICA
A Pedro Nava
Uma coisa triste no fundo da sala.
Me disseram que era Chopin.
A mulher de braços redondos que nem coxas
martelava na dentadura dura
sob o lustre complacente.
Eu considerei as contas que era preciso pagar,
os passos que era preciso dar,
as dificuldades...
Enquadrei o Chopin na minha tristeza
e na dentadura amarela e preta
meus cuidados voaram como borboletas.
Carlos Drummond de Andrade
Me disseram que era Chopin.
A mulher de braços redondos que nem coxas
martelava na dentadura dura
sob o lustre complacente.
Eu considerei as contas que era preciso pagar,
os passos que era preciso dar,
as dificuldades...
Enquadrei o Chopin na minha tristeza
e na dentadura amarela e preta
meus cuidados voaram como borboletas.
Carlos Drummond de Andrade
Diga-me, por favor
Tell me something you love. Thank you!
Este é um exercício de improvisação, mas serve para brincarmos e conhecermos um pouquinho mais cada um de nós. É delicioso fazer com um parceiro. Pedimos que o outro nos fale alguma coisa que ama e sempre agradecemos pelo parceiro ter compartilhado isso conosco. É uma tarefa simples, de repetição, um na frente do outro, insistindo na pergunta umas cinco vezes, depois troca, quem perguntou agora responde e nós dizemos a primeira coisa que nos vem a cabeça, sem refletir, sem elaborar. E vocês?
ADORO DISSO
Peço licença à Helena para usar sua expressão... Minha pequena bípede ruivinha tem como marca registrada uma construção gramatical peculiar. Não adianta corrigir: ela adora de. Lembrei disso agora, porque hoje, eu estou adorando de também. Como uma criança deslumbrada pela vida novinha em folha. Adoro de viver. Adoro de ser feliz. Adoro de você.
Sobre Saramago.
Aqui os dejo un pequeño clip con algo que me gustó mucho sobre el querido Saramago.
saludos.
saludos.
Mundo Livre S.A. - Meu Esquema
Ah...Fred Zero Quatro...
e suas declarações...
brilhantes...
Beijos
Leca
Criação
" A criação é a mais eficaz de todas as escolas de paciência e lucidez. É também testemunho transtornador da única dignidade do homem: a revolta tenaz contra sua condição, a perseverança em um esforço considerado estéril. Exige um esforço cotidiano, o domínio de si mesmo, a apreciação exata dos limites do verdadeiro, a medida e a força. Constitui uma acese. Tudo isso "para nada", para repetir e espernear. Mas talvez a grande obra de arte tenha menos importância em si mesmo do que na prova que exige de um homem e na ocasião que lhe proporciona de vencer seus fantasmas e de se aproximar um pouco mais de sua realidade nua."
De Willian Faulkner
Será possivel ?
Num futuro próximo ?
Já existiu aquela coisa japonesa, o Tamagochi. Agora existe o Farmville, tudo virtual. É bom termos noção disto, podemos perservar valores mais terrenos e mais simples. Penso eu de que.
Lugares
" É útil visitar, por vezes, os lugares onde se passaram minutos decisivos da nossa vida, nem que seja para nos darmos conta de que nada temos de comum conosco." Imre Kertész
segunda-feira, 28 de junho de 2010
Necessário
Quando todos puderem beber água da torneira!!!!!
Acho que esse seria o momento de falar sobre a Copa, sobre minha estada no Brasil....mas não quero. Estou muito mobilizada com um antigo assunto, e que deu origem a esse blog. Me desculpem, mas falarei sobre câncer mais uma vez!
Hoje minha sobrinha me contou pelo Twitter que estava triste e chocada, pois um amigo de 21 anos acabara de descobrir um câncer. Ela comentava, que ele era muito novo...sensação normal para uma adolescente. Nessa idade, somos imortais, ou melhor, nunca pensamos na morte. Vivemos com a ilusão da imortalidade.
Nesses últimos dias, fiquei bastante indignada com uma entrevista de Hebe Camargo na TV e em revistas falando sobre câncer. Na verdade, ela falava sobre "essa doença", ela não fala a palavra câncer. Tempos atrás fiquei muito indignada também com a postura da candidata a presidência do Brasil, ela passou um "sabão" nos brasileiros que não fazem seus exames preventivos e por isso quando descobrem o câncer, esse já está em estado avançado.
Bom...todos voces sabem que meu marido luta contra um câncer com metástase, e sua luta tem sido bem sucedida. Todos sabem que ele teve o que existe de melhor em termos de atenção médica. Ele recebeu tratamento de primeiro mundo durante todas as fases. Pudemos fazer tratamento em SP, pudemos escolher os melhores médicos, tivemos acesso a informações de pesquisas recentes, e hoje ele é acompanhado, aqui nos EUA, no maior centro de pesquisa e tratamento de câncer do mundo, o MD Anderson.
Sei que Judson teve e tem muito mais chances de vencer essa "meleca de doença" (como uma amiga linda que perdeu os pais pra essa doença, chama o câncer) , que qualquer outra pessoa que não tenha tido as mesmas condições de tratamento. Embora saiba que mesmo recebendo esse tratamento, não estávamos garantidos de nada, sabiamos que estávamos lutando com as melhores armas que existiam. Isso nos deu uma tranquilidade absurda.
Entretanto pude ver e acompanhar de perto, pessoas incríveis, que lutaram muito contra o câncer e que sucumbiram. Vi pessoas com excelentes tratamentos que sucumbiram. Vi pessoas que não tiveram chance nenhuma, pois além de lutarem contra o câncer, lutavam também contra o descaso do nosso sistema de saúde, lutavam contra péssimas condições de tratamento, lutavam contra máquinas de radioterapia que quebravam e não tinha prazo de retorno, lutavam sabendo que existiam armas muito melhores na medicina, mas que elas não tinham e não teriam acesso. Muito triste lutar, sabendo que não dispões dos instrumentos já existentes para essa guerra!
Bom...a Sra. Dilma parece que está vencendo essa luta também, mas humildade que é bom, ela não tem nenhuma. Ela desrespeita a todos que batalham por uma consulta no SUS, e esperam meses por uma tomografia, ela desrespeita a todos que precisam sair dos seus estados e cidades em busca de algum tratamento, mesmo sem qualidade, por que em suas cidades não teriam tratamento algum. Ela acusa os brasileiros por serem descuidados com sua saúde!
A Sra Hebe, que provavelmente agora, já acredita na imortalidade, diz que o câncer não é um monstro! Claro que não. Ele não teve que implorar por uma vaga nas imensas filas para receber Radioterapia que existem nesse país. Ela não teve que lidar com funcionários despreparados, unidades de saúde imundas, hospitais onde faltam até gaze, quanto mais quimioterápicos. Ela não precisou entrar numa fila de mêses para ser operada.
As senhoras Hebe e Dilma, tiveram exatamente o que meu marido teve. Tratamento de qualidade, tratamento de primeiro mundo. Elas tiveram aquilo que todo mundo deveria ter. Elas foram tratadas com respeito e atenção. Elas receberam tratamento com presteza e rapidez, exatamente como deve receber alguém que tem diagnóstico de câncer. Nada de errado com o que elas receberam. Isso talvez seja a razão para a "cura" tão rápida delas, e espero sinceramente que seja com o meu marido também.
Uma vez li, alguém dizendo que algumas pessoas podem pensar que viver no primeiro mundo é poder beber água Perrier, mas que não era nada disso, a grande diferença em viver num país de primeiro mundo, é que todos podem beber água da torneira!!!!
Ficarei feliz se um dia, todos no Brasil, possam receber o mesmo tratamento que meu marido, Hebe e Dilma receberam e recebem.
Ludmila Rohr
P.S. Esse texto é uma homenagem a alguns amigos que se foram nessa luta e especialmente para o Gustavo que luta corajosamente contra essa doença maluca!
Originalmente aqui!
Originalmente aqui!
TRISTEZA (IN)JUSTIFICADA
Ele era amado, mas talvez não o suficiente para suprir o seu complexo vazio de ser. Nada era capaz disso, ele bem sabia. Nem toda a vida, com suas perguntas e respostas, seria capaz de torná-lo inteiro. Acho que ele não queria ser inteiro. Não queria ser feliz. Encontrava-se melhor em sua tristeza, que já não era somente um estado de espírito. Se amava? Talvez, nos intervalos em que se permitia sentir algo tão simples, e quase bom. Mas havia dias em que ele sonhava e enxergava os vultos de um amor impossível. Somente pelo prazer de ter um motivo para sentir dor. Para gostar mais ainda dos dias cinzas como esse.
Dois
Quanto
Quanto de mim há em cada pedaço do que sou
E quanto de mim há em cada pedaço do que nego ser?
Quanto de mim sobrevive ao idealismo
E quanto de mim morre diante do desmascaramento?
Quanto de mim resta, ao final de tudo?
Quanto,
quem,
como,
onde,
por que
e até quando?
Obs.:
Poema publicado também no blog Empirismo Vernacular em 23/02/2010 (http://www.eng-ivanbueno.blogspot.com/).
E quanto de mim há em cada pedaço do que nego ser?
Quanto de mim sobrevive ao idealismo
E quanto de mim morre diante do desmascaramento?
Quanto de mim resta, ao final de tudo?
Quanto,
quem,
como,
onde,
por que
e até quando?
Obs.:
Poema publicado também no blog Empirismo Vernacular em 23/02/2010 (http://www.eng-ivanbueno.blogspot.com/).
domingo, 27 de junho de 2010
Translúcido
Transparência real
só há nas coisas que não têm íntimo,
parte de dentro, recheio;
coisas que são ocupadas pela luz
passageira
em hospedagem de relâmpagos.
Vez ou outra, sou transparente
para você;
eis que sou aquele nada,
outro ninguém.
O seu olhar sequer me atravessa
porque não estou ali.
O seu olhar vê além.
Outros poemas em Diário Extrovertido
só há nas coisas que não têm íntimo,
parte de dentro, recheio;
coisas que são ocupadas pela luz
passageira
em hospedagem de relâmpagos.
Vez ou outra, sou transparente
para você;
eis que sou aquele nada,
outro ninguém.
O seu olhar sequer me atravessa
porque não estou ali.
O seu olhar vê além.
Outros poemas em Diário Extrovertido
FLIP 2010
Agora que já babou nos nomes, acesse http://www.flip.org.br/ e descubra tudo sobre preços, condições, locais de venda e datas. Ou vai me dizer que vai perder de ver Isabel Allende ou Lou Reed?
Gira o mundo, gira....
Meus amores do Mínimo Ajuste. Achei lindo. Espero que apreciem também!
Gira Mundo Gira o mundo, gira. Dê voltas e siga o destino até o além. Busque! Traga as esperanças perdidas pelo tempo... Nascem os seres de luz renova-se em cada rosto tomando forma... Ganhando vida. Gira o mundo, gira... Volte pelos rastros deixados como a senha de um retorno dos sonhos que ficaram... Reconheço-te! Foi parte de minha energia rompida pelo tempo. Há uma opacidade em uma metade de mim... É a luz. Reencontros num momento fiam de esperança respirando vida... És a luz que completa novamente meu viver... Gira mundo, gira encontro meu elo perdido... Parte de minha vida! Ge Fazio
Gira Mundo Gira o mundo, gira. Dê voltas e siga o destino até o além. Busque! Traga as esperanças perdidas pelo tempo... Nascem os seres de luz renova-se em cada rosto tomando forma... Ganhando vida. Gira o mundo, gira... Volte pelos rastros deixados como a senha de um retorno dos sonhos que ficaram... Reconheço-te! Foi parte de minha energia rompida pelo tempo. Há uma opacidade em uma metade de mim... É a luz. Reencontros num momento fiam de esperança respirando vida... És a luz que completa novamente meu viver... Gira mundo, gira encontro meu elo perdido... Parte de minha vida! Ge Fazio
Com amor e carinho,
Sílvia
"O Beijo" - Auguste Rodin
Toco a tua boca, com um dedo toco o contorno da tua boca, vou desenhando essa boca como se estivesse saindo da minha mão, como se pela primeira vez a tua boca se entreabrisse e basta-me fechar os olhos para desfazer tudo e recomeçar. Faço nascer, de cada vez, a boca que desejo, a boca que a minha mão escolheu e te desenha no rosto, uma boca eleita entre todas, com soberana liberdade eleita por mim para desenhá-la com minha mão em teu rosto e que por um acaso, que não procuro compreender, coincide exatamente com a tua boca que sorrí debaixo daquela que a minha mão te desenha.
Tu me olhas, de perto tu me olhas, cada vez mais de perto e, então, brincamos de cíclope, olhamo-nos cada vez mais de perto e nossos olhos se tornam maiores, aproxiam-se, sobrepõem-se e os cíclopes se olham, respirando indisdintas, as bocas
encontram-se e lutam debilmente, mordendo-se com os lábios, apoiando ligeiramente a língua nos dentes, brincando nas suas cavernas, onde um ar pesado vai e vem com um perfume antigo e um grande silêncio. Então, as minhas mãos procuram afogar-se nos teus cabelos, acariciar lentamente a profundidade do teu cabelo enquanto nos beijamos como se tivéssemos a boca cheia de flores ou de peixes, de movimentos vivos, de fragrância obscura. E, se nos mordermos, a dor é doce; e, se nos afogarmos num breve e terrível absorver simultâneo de fôlego, essa instantânea morte é bela. E já existe uma só saliva e um só sabor de fruta madura, e eu te sinto tremular contra mim, como uma lua na água.
Júlio Cortázar, em "O Jogo da Amarelinha" - Rio de Janeiro - Civilização Brasleira, 2009.
Lição de Vida.
O pai de Eduardo era um moralista. Embora despejasse os piores palavrões quando estivesse com raiva (geralmente contra a própria família), não falava jamais em sexo com os filhos. Criticava tudo e a todos. Para ele tudo era pecado, vulgar e nojento. Bonito e viril, jamais demonstrou em público qualquer libido pela mulher. Tinha muita vergonha das duas irmãs serem separadas, e no que Eduardo percebeu isso começou a massacrá-lo. Dizia-lhe que elas não tinham culpa. Isso era uma maldição da família, já que sua mãe e sua avó também haviam sido abandonadas pelos maridos. Deveriam ter contratado um bom pai de santo para quebrar a feitiçaria. Agora era tarde para reclamar. Mas ele também era um ser prático e determinado. Suas convicções e prioridades mudavam conforme suas necessidades. Cumpria com seus objetivos a qualquer preço. Para ele as férias eram sagradas. Todos os anos esperava ansiosamente o momento em que mudassem da casa da cidade para o apartamento praiano. Ele contava os dias para isso. A mãe de Eduardo era oposto. Não criticava ninguém, compreendia as diferenças e, embora de poucas amizades, mas boas, gostava de apreciar e de conviver com pessoas pouco ortodoxas. Tinha uma simpatia imensa pelas prostitutas, um carinho pelas mães solteiras, e de vez em quando recolhia famílias da rua e as levava para almoçar em casa. Na cozinha, panelões imensos eram aquecidos no fogão a lenha para os meninos que compareciam todos os dias para o almoço. Por outro lado, era extremamente comodista. Fora criada com todo o conforto possível e contava com um séquito de colaboradoras que trabalharam para ela até se aposentarem. Houve época em que eram 4 ou 5. A casa era grande e os filhos precisavam estar bem atendidos. Mas o verão estava chegando, e não conseguia ninguém para levar para a praia por dois meses. Suas fiéis escudeiras eram casadas e tinham filhos. O desespero foi batendo nos dois. Mais nele, porque sabia que a mulher, sem pelo menos duas serviçais, não daria um passo para fora de casa. Ele mesmo tratou de providenciar. Como era médico, perguntou a uma paciente do INPS se ela estava empregada. Ela disse que não, que era ótima cozinheira e que sua irmã lavava e passava muito bem. Ainda por cima ela tinha nome de santa, chamava-se “Benta”, e a xereca estava perfeita. Ele não titubeou. Mesmo sem conhecê-la direito ou checar referências contratou imediatamente seus serviços. Naquela época Eduardo tinha apenas 12 anos e ansiava por conhecer os fatos da vida. Saber os pormenores mais vulgares. Ele só pensava naquilo, mas ninguém tinha a decência de lhe explicar. Ao chegarem na praia, verificou-se que era verdade o informado pela Benta. Os anjos a enviaram, pelo menos para Eduardo. Elas cozinhavam divinamente e tinham uma disposição impressionante. Após o jantar, as irmãs limpavam tudo rapidamente e sumiam, deixando a família com total privacidade. Perfeito. Como nunca foi bobo, Eduardo começou a reparar que elas se arrumavam muito e que chegavam tarde. Um dia ouviu uma perguntando para a outra quanto havia ganhado na noite anterior. Ficou atento, passou a vigiar os passos e a ouvir as conversas. Elas gostavam do Eduardo, pediram segredo e abriram o jogo. Estavam faturando alto, muito mais do que como domésticas. Faziam de dois a três programas por noite. A mais novinha cobrava 100, a mais velha 80. Melhor do que isso. Tinham senso empresarial. Haviam colocado inclusive a empregada do desembargador para trabalhar com elas, e a terceira irmã em breve chegaria para se unir às santas do “São Bento”, por coincidência, nome do respeitável edifício. Foram extremamente generosas com ele. Lhe explicaram tudo o que faziam, e o valor diferente de cada ato. Beijavam inclusive, não tinham medo de se apaixonar por seus clientes. Salientaram o quanto uma língua faz por um relacionamento, e lhe descreveram como um homem deveria usar a sua se quisesse de verdade dar prazer à mulher. Lição essa que Eduardo guardou como uma das mais valiosas. Não demorou muito a vizinhança estava comentando, e o fato chegou aos ouvidos do Dr. Eduardo ficou com pena delas, sua mãe ficou apreensiva, pois gostava das mocinhas, e o bom Dr. com um problemão. O que fazer? Na sua casa duas rameiras a conviver com sua família. E o que é pior, uma das mocinhas era menor de idade. Isso era demais para seus rígidos princípios morais. Inadmissível. Uma mera conversa não resolveria. Ainda faltava um mês para terminar o verão e eles não poderiam ficar sem elas. Encontrou então a solução mágica. Deu-lhes uma palestra sobre moral, saúde sexual (era especialista nessa área), e recomendou-lhes o centro espírita mais próximo. Após dois ou três passes, elas poderiam ficar. Tudo estaria resolvido e, para que tivesse certeza que na sua casa imperava o respeito, fez questão de não tocar mais no assunto. Isso foi fofoca da vizinhança, inveja das outras patroas que não tinham serviçais tão prestativas e uma família tão bem constituída quanto a dele.
Definições definitivas...
Eu não faço nada, mas sou bem bom no que eu faço nesse ramo de não fazer nada.
JOSÉ - a revista
JOSÉ, a revista de literatura, crítica & arte que durou apenas dez números, sendo que dois deles em apenas um volume. Saiu nas bancas em julho de 1976, em plena ebulição da tal da “abertura lenta e gradual” do regime do General Ernesto Geisel. Um Brasil diferente, estranho, que havia feito já as eleições de 1974, um bocado diferentes das imediatamente anteriores. Um Brasil que reiniciaria dentro em breve suas passeatas estudantis. Um Brasil que ainda estava um bocado traumatizado pela morte do Wladimir. Enfim, um Brasil sedento, desejoso de “um certo modo JOSÉ, de julgar, ler, escrever ou perguntar, repetida e compulsivamente, como no célebre poema do mesmo nome”, tal e qual dito por Gastão de Holanda no primeiro número da revista. Com dificuldades econômicas, no entanto, não conseguiu uma periodicidade regular, chegando a ter de editar dois números em um único volume (5 e 6 de dez/76) e vindo a fechar as portas, editando o número 10 em julho de 1978, dois anos após sua magnífica estréia. O número 9 saíra em dez/1977 e havia seis meses que os leitores e, principalmente, os assinantes clamavam pela continuidade. Com o falecimento de um dos grandes intelectuais e colaborador da revista, Otto Maria Carpeaux, o décimo número meio que a ele acabou dedicado. Infelizmente, pouco depois, os assinantes receberam uma singela carta informando o fim da empreitada, por absoluta falta de grana e excesso de dívidas. Não houve quem ali visse uma oportunidade editorial, uma janela de marqueting, um veículo moderno ou um nicho de mercado. Era um outro país.
Abertura
[Andrea de Godoy Neto]
Não sei me preocupar com problemas futuros,
Não sei rir do que não acho graça,
Não sei fingir com o que não me toca,
Não sei molhar o pé sem molhar a roupa,
Tomar banho sem lavar o cabelo,
Não sei olhar alguém sem enxergar-lhe a alma,
Não sei olhar para o céu sem me sentir livre,
Não sei olhar um bicho sem sorrir,
Não sei olhar para você sem me entregar inteira,
Sem mergulhar, sem te querer para mim...
Eu sei viver as minhas verdades,
Acredito sempre no que sinto,
Mas não gosto de frases feitas, de saberes prontos, de rotinas perfeitas,
Não gosto de receita de bolo, de uniforme, de críticos profissionais,
Não gosto do socialmente aceitável, do esteticamente correto, de falsos intelectuais,
Eu gosto de história em quadrinhos, de livro de filosofia,
Gosto de romance, de drama,
Só não gosto de jornal,
Jornal suja a mão, tem notícia triste, não gosto de jornal...
Gosto de fotografia,
De café com conversa,
De chuva na vidraça,
Gosto de silêncio,
Eu gosto muito de silêncio fora, mas gosto ainda mais quando há silêncio dentro de mim,
Gosto de andar na praia,
Gosto de sorvete, mesmo no inverno,
Gosto de banho demorado,
Gosto do teu riso,
Não só o sorriso, o riso mesmo, aquele que te faz parecer um menino...
Gosto de pessoas felizes, gosto daquelas que são profundas,
Sei reconhecer o valor da tristeza,
Mas prefiro sempre a alegria,
Adoro tempestades e aquele vento que tudo varre,
Gosto de misturar doce e salgado,
De dormir até tarde,
Gosto de assistir desenho animado, mesmo aqueles que eu já vi muitas e muitas vezes,
Gosto de ouvir as pessoas falando,
Mas quando elas falam de coração, quando elas se despem, se abrem,
Hoje, eu gosto mais de gente do que gostava antes,
Porque, hoje, a minha casca é mais fina,
Eu não me protejo tanto,
Gosto mais de mim, hoje, do que gostava antes,
Porque de tanto me proteger, às vezes, nem eu mesma me via,
E, hoje, eu me mostro para quem quiser ver...
Para quem puder ver...
Leia mais: Andrea de Godoy Neto em Olhar em Versos e Inversos: Abertura
Under Creative Commons License: Attribution Non-Commercial No Derivatives
sábado, 26 de junho de 2010
AS SEM-RAZÕES DA PAIXÃO
Gerana Damulakis
Nem me pergunte sobre ela, sobre ele, sobre ambos. Não sei de nada. Para explicar as razões de uma paixão que não se realiza são precisos conhecimento e muito mais arte que qualquer psicologia possa achar factível nas palavras. No poema “As Sem-Razões do Amor”, Carlos Drummond de Andrade dá um show de entendimento e a última estrofe coroa o poema, coroa o sentimento, de forma única e, para dizer melhor, de forma completa. Trata, porém, do amor. Paixão é outra coisa.
Aqui, no entanto, não há palavras, versos, estrofes. Aqui há a paixão. Certo é que por vezes arrefece, depois volta. Nunca se tocaram, nem me pergunte qual a razão, mais uma vez garanto não saber. Um dia, faz anos, ele disse que teve uma paixão enrustida por uma amiga e em oportunidade surgida, não criada, calhou de ficarem a sós. Não trocaram uma palavra sobre sentimento ou sobre tesão, apenas se tocaram. Deste toque foram direto para um amasso total. Grudaram. Tinham represado muito desejo. Bastou tocar e explodiu. Excitante, claro que é excitante.
Pensando direitinho, acho que ele contou a historinha já sabendo que ela ficaria excitada, tentada a fazer igual, e a guardaria para sempre na memória. Não deu outra. Ela guardou na memória. O que intriga é a razão da paixão no ar entre os dois. Da parte dela, acho que vem da admiração, da maneira que ela imagina que ele sente as coisas da alma. Da parte dele, não vejo qual razão poderia ser; talvez física, talvez a expansividade dela seja atraente. Quem pode atestar as sem-razões da paixão?
Os anos foram passando e nada fora acrescentado ao suposto romance. Estava ali, entretanto. Estava ali o desejo. Ele ia envelhecendo, ela também obviamente. Mas ele tem duas décadas na frente dela e seu envelhecimento é mais visível nesta etapa da vida. Os pés-de- galinha ao redor dos olhos dele estão tão profundos. O olhar, todavia belo. No total, porém, ele não emanava atração, não tinha qualquer parte ou detalhe sensual. E como despertava essa coisa invisível e poderosa? Ela fica toda contente quando sente isso. E nem pensa em explicações. Quem pensa sou eu, quem matuta razões sou eu.
Um dia tudo retorna, a tensão no ar, ele sem as rugas no rosto, só a poesia na alma. Ela, querendo flutuar nas nuvens, nas nuvens – lugar onde apenas a paixão é capaz de nos colocar. Ela entra no escritório dele, fala coisas inteligentes, tenta impressioná-lo, tenta reter aquele olhar de admiração que voltou e, pronto, ela está totalmente enamorada outra vez. Ele pensa bastante no que não houve. Não sei se pensa no que pode haver. Será? Ele está velho e ela está velha. Continuamos sem entender as razões da paixão. Ano entra, ano se vai. E a vida está passando. Mas nós, seguramente, nos apaixonamos.
Nem me pergunte sobre ela, sobre ele, sobre ambos. Não sei de nada. Para explicar as razões de uma paixão que não se realiza são precisos conhecimento e muito mais arte que qualquer psicologia possa achar factível nas palavras. No poema “As Sem-Razões do Amor”, Carlos Drummond de Andrade dá um show de entendimento e a última estrofe coroa o poema, coroa o sentimento, de forma única e, para dizer melhor, de forma completa. Trata, porém, do amor. Paixão é outra coisa.
Aqui, no entanto, não há palavras, versos, estrofes. Aqui há a paixão. Certo é que por vezes arrefece, depois volta. Nunca se tocaram, nem me pergunte qual a razão, mais uma vez garanto não saber. Um dia, faz anos, ele disse que teve uma paixão enrustida por uma amiga e em oportunidade surgida, não criada, calhou de ficarem a sós. Não trocaram uma palavra sobre sentimento ou sobre tesão, apenas se tocaram. Deste toque foram direto para um amasso total. Grudaram. Tinham represado muito desejo. Bastou tocar e explodiu. Excitante, claro que é excitante.
Pensando direitinho, acho que ele contou a historinha já sabendo que ela ficaria excitada, tentada a fazer igual, e a guardaria para sempre na memória. Não deu outra. Ela guardou na memória. O que intriga é a razão da paixão no ar entre os dois. Da parte dela, acho que vem da admiração, da maneira que ela imagina que ele sente as coisas da alma. Da parte dele, não vejo qual razão poderia ser; talvez física, talvez a expansividade dela seja atraente. Quem pode atestar as sem-razões da paixão?
Os anos foram passando e nada fora acrescentado ao suposto romance. Estava ali, entretanto. Estava ali o desejo. Ele ia envelhecendo, ela também obviamente. Mas ele tem duas décadas na frente dela e seu envelhecimento é mais visível nesta etapa da vida. Os pés-de- galinha ao redor dos olhos dele estão tão profundos. O olhar, todavia belo. No total, porém, ele não emanava atração, não tinha qualquer parte ou detalhe sensual. E como despertava essa coisa invisível e poderosa? Ela fica toda contente quando sente isso. E nem pensa em explicações. Quem pensa sou eu, quem matuta razões sou eu.
Um dia tudo retorna, a tensão no ar, ele sem as rugas no rosto, só a poesia na alma. Ela, querendo flutuar nas nuvens, nas nuvens – lugar onde apenas a paixão é capaz de nos colocar. Ela entra no escritório dele, fala coisas inteligentes, tenta impressioná-lo, tenta reter aquele olhar de admiração que voltou e, pronto, ela está totalmente enamorada outra vez. Ele pensa bastante no que não houve. Não sei se pensa no que pode haver. Será? Ele está velho e ela está velha. Continuamos sem entender as razões da paixão. Ano entra, ano se vai. E a vida está passando. Mas nós, seguramente, nos apaixonamos.
Ilustração: O beijo, de Henri de Toulouse-Lautrec.
A Grande Volta
A grande volta olímpica dessa Copa foi a de Gana. Não importa quem ganhar a Copa, nada terá o mesmo significado. Não me interpretem mal. Minha pátria amada Brasil é a minha mãe, meu pai é a America do Sul, minha amante é a Europa, mas a minha avó é a África. Foi de lá que todos saímos. Tenho muito orgulho da minha origem brasileira e portuguesa, mas não deixo de sentir uma extrema vergonha de ser fruto de duas sociedades que construíram suas economias em cima da escravatura. A família da minha mãe, embora sustentada por esse sistema odioso, só se redime um pouco porque o meu bisavô materno fundou um jornal abolicionista. A família do meu pai era tão pobre, que esse pecado pelo menos não tem. O que a Inglaterra, Portugal, Brasil , Estados Unidos e França fizeram com esse continente não tem precedentes. Exterminaram povos inteiros, acabaram com famílias que se amavam, roubaram suas riquezas, levaram seus espécimes mais fortes para em outros continentes trabalharem de sol a sol, levarem chicotadas, serem torturados, somente para que fizessem o trabalho que os descendentes de europeus não estavam dispostos a fazer. Nem a sociedade Nazista foi tão horrível, e olha que o que eles fizeram não tem desculpas. O Brasil então, ainda carrega a pecha de ter sido o último país a abolir a escravatura. Já estive na África duas vezes, e percebi o ódio que eles têm dos descendentes de Portugueses e de Ingleses. Pois desculpo eles, não é para menos. A miséria, mesmo na África do Sul, é absoluta. O “apartheid” não terminou coisa nenhuma. Existe uma pequena elite negra, mas a maioria das mansões e hotéis de luxo são destinados aos brancos. Tive a oportunidade de me hospedar em dois hotéis luxuosíssimos. Embora ninguém tivesse coragem de dizer, um era frequentado predominantemente por hóspedes negros, e outro por hóspedes brancos. Casualmente, o hotel cujos hóspedes eram brancos era ainda mais luxuoso. Negros nos carros, quase sempre são motoristas. Nas estradas a minha vontade era de chorar. Havia diversas mulheres magérrimas, com crianças barrigudas pedindo carona e andando pelos campos (savanas) a esmo, pois aonde for que chegassem nada receberiam. Nas ruas as pessoas imploravam por esmolas ou para vender seus artigos feitos a mão a preço de nada. A dívida do Brasil, Estados Unidos, Inglaterra, Portugal e da França com esse continente continua. Quando é que vão criar vergonha na cara e tratar de remediar o mal que fizeram? Hoje, quando vi aquele time, vindo de um país miserável (vou ter que procurar no mapa para saber onde fica), derrotando a maior potencia mundial, cujo time era basicamente formado por loiros que fariam o Sr. Hitler dizer que estava certo quanto a superioridade ariana, chorei bem chorado. Foi o grande jogo até agora. Se o Brasil não ganhar a Copa, torço por eles. Merecem! São campeões pelo simples fato de estarem vivos, de terem chegado inteiros até o campo de futebol. Sei que o meu desejo pouco importa, e que o Brasil tem pouquíssimas chances de sair vitorioso, pois a única coisa que realmente chama a atenção no nosso time é o figurino do Dunga. Mas para mim, depois desse jogo, essa Copa já é a melhor de todas.Viva Gana! Viva a África!
sexta-feira, 25 de junho de 2010
A MENTE APAGA REGISTROS DUPLICADOS
Meus Queridos do Mínimo Ajuste:
Este texto abaixo é fantástico. Mostra a vida como ela é e como deve e precisa ser vivida.
Não deixe de ler e guarde para, daqui a um tempo, ler novamente porque a vida deve ser literalmente curtida!
A MENTE APAGA REGISTROS DUPLICADOS
Por Airton Luiz Mendonça
(Artigo do jornal O Estado de São Paulo)
O cérebro humano mede o tempo por meio da observação dos movimentos.
Se alguém colocar você dentro de uma sala branca vazia, sem nenhuma mobília, sem portas ou janelas, sem relógio... Você começará a perder a noção do tempo.
Por alguns dias, sua mente detectará a passagem do tempo sentindo as reações internas do seu corpo, incluindo os batimentos cardíacos, ciclos de sono, fome, sede e pressão sanguínea.
Isso acontece porque nossa noção de passagem do tempo deriva do movimento dos objetos, pessoas, sinais naturais e da repetição de eventos cíclicos, como o nascer e o pôr do sol.
Compreendido este ponto, há outra coisa que você tem que considerar:
Nosso cérebro é extremamente otimizado.
Ele evita fazer duas vezes o mesmo trabalho.
Um adulto médio tem entre 40 e 60 mil pensamentos por dia.
Qualquer um de nós ficaria louco se o cérebro tivesse que processar conscientemente tal quantidade.
Por isso, a maior parte destes pensamentos é automatizada e não aparece no índice de eventos do dia e, portanto, quando você vive uma experiência pela primeira vez, ele dedica muitos recursos para compreender o que está acontecendo.
É quando você se sente mais vivo.
Conforme a mesma experiência vai se repetindo, ele vai simplesmente colocando suas reações no modo automático e 'apagando' as experiências duplicadas.
Se você entendeu estes dois pontos, já vai compreender porque parece que o tempo acelera, quando ficamos mais velhos e porque os Natais chegam cada vez mais rapidamente.
Quando começamos a dirigir automóveis, tudo parece muito complicado, nossa atenção parece ser requisitada ao máximo. Então, um dia dirigimos trocando de marcha, olhando os semáforos, lendo os sinais ou até falando ao celular ao mesmo tempo.
Como acontece?
Simples: O cérebro já sabe o que está escrito nas placas (você não lê com os olhos, mas com a imagem anterior, na mente); O cérebro já sabe qual marcha trocar (ele simplesmente pega suas experiências passadas e usa no lugar de repetir realmente a experiência).
Ou seja, você não vivenciou aquela experiência, pelo menos para a mente. Aqueles críticos segundos de troca de marcha, leitura de placa são apagados de sua noção de passagem do tempo.
Quando você começa a repetir algo exatamente igual, a mente apaga a experiência repetida.
Conforme envelhecemos as coisas começam a se repetir - as mesmas ruas, pessoas, problemas, desafios, programas de televisão, reclamações, -.... Enfim... As experiências novas (aquelas que fazem a mente parar e pensar de verdade, fazendo com que seu dia pareça ter sido longo e cheio de novidades), vão diminuindo.
Até que tanta coisa se repete que fica difícil dizer o que tivemos de novidade na semana, no ano ou, para algumas pessoas, na década.
Em outras palavras, o que faz o tempo parecer que acelera é a... ROTINA!
A rotina é essencial para a vida e aperfeiçoa muita coisa, mas a maioria das pessoas ama tanto a rotina que, ao longo da vida, seu diário acaba sendo um livro de um só capítulo, repetido todos os anos.
Felizmente há um antídoto para a aceleração do tempo: M & M (Mude e Marque).
- Mude, fazendo algo diferente e marque, fazendo um ritual, uma festa ou registros com fotos.
- Mude de paisagem, tire férias com a família (sugiro que você tire férias sempre e, preferencialmente, para um lugar quente, um ano, e frio no seguinte) e marque com fotos, cartões postais e cartas.
- Tenha filhos (eles destroem a rotina) e sempre faça festas para eles, e para você (marcando o evento e diferenciando o dia).
- Use e abuse dos rituais para tornar momentos especiais diferentes de momentos usuais.
- Faça festas de noivado, casamento, bodas disso ou daquilo, bota-foras, participe do aniversário de formatura de sua turma, visite parentes distantes, entre na universidade com 60 anos, troque a cor do cabelo, deixe a barba, tire a barba, compre enfeites diferentes para sua casa, vá a shows, cozinhe uma receita nova, tirada de um livro novo.
- Escolha roupas diferentes, não pinte a casa da mesma cor, faça diferente.
- Beije diferente sua paixão e viva com ela momentos diferentes.
- Vá a mercados diferentes, leia livros diferentes, busque experiências diferentes.
Seja diferente!
Se você tiver dinheiro, especialmente se já estiver aposentado, vá com seu marido, esposa ou amigo para outras cidades ou países veja outras culturas, visite museus estranhos, deguste pratos esquisitos... Em outras palavras... V-I-V-A!
Porque se você viver intensamente as diferenças, o tempo vai parecer mais longo.
E se tiver a sorte de estar casado (a) com alguém disposto (a) a viver e buscar coisas diferentes, seu livro será muito mais longo, muito mais interessante e muito mais v-i-v-o... Do que a maioria dos livros da vida que existem por aí.
Cerque-se de parentes e amigos.
Parentes e amigos com gostos diferentes, vindos de lugares diferentes, e que gostam de comidas diferentes.
Enfim, acho que você já entendeu o recado, não é?
Felicidades em suas experiências para expandir seu tempo, com qualidade, emoção, rituais e vida.
E S CR EVA em tAmaNhos diFeRenTes e em CorES difErEntEs!
Com amor e carinho,
Sílvia
Este texto abaixo é fantástico. Mostra a vida como ela é e como deve e precisa ser vivida.
Não deixe de ler e guarde para, daqui a um tempo, ler novamente porque a vida deve ser literalmente curtida!
A MENTE APAGA REGISTROS DUPLICADOS
Por Airton Luiz Mendonça
(Artigo do jornal O Estado de São Paulo)
O cérebro humano mede o tempo por meio da observação dos movimentos.
Se alguém colocar você dentro de uma sala branca vazia, sem nenhuma mobília, sem portas ou janelas, sem relógio... Você começará a perder a noção do tempo.
Por alguns dias, sua mente detectará a passagem do tempo sentindo as reações internas do seu corpo, incluindo os batimentos cardíacos, ciclos de sono, fome, sede e pressão sanguínea.
Isso acontece porque nossa noção de passagem do tempo deriva do movimento dos objetos, pessoas, sinais naturais e da repetição de eventos cíclicos, como o nascer e o pôr do sol.
Compreendido este ponto, há outra coisa que você tem que considerar:
Nosso cérebro é extremamente otimizado.
Ele evita fazer duas vezes o mesmo trabalho.
Um adulto médio tem entre 40 e 60 mil pensamentos por dia.
Qualquer um de nós ficaria louco se o cérebro tivesse que processar conscientemente tal quantidade.
Por isso, a maior parte destes pensamentos é automatizada e não aparece no índice de eventos do dia e, portanto, quando você vive uma experiência pela primeira vez, ele dedica muitos recursos para compreender o que está acontecendo.
É quando você se sente mais vivo.
Conforme a mesma experiência vai se repetindo, ele vai simplesmente colocando suas reações no modo automático e 'apagando' as experiências duplicadas.
Se você entendeu estes dois pontos, já vai compreender porque parece que o tempo acelera, quando ficamos mais velhos e porque os Natais chegam cada vez mais rapidamente.
Quando começamos a dirigir automóveis, tudo parece muito complicado, nossa atenção parece ser requisitada ao máximo. Então, um dia dirigimos trocando de marcha, olhando os semáforos, lendo os sinais ou até falando ao celular ao mesmo tempo.
Como acontece?
Simples: O cérebro já sabe o que está escrito nas placas (você não lê com os olhos, mas com a imagem anterior, na mente); O cérebro já sabe qual marcha trocar (ele simplesmente pega suas experiências passadas e usa no lugar de repetir realmente a experiência).
Ou seja, você não vivenciou aquela experiência, pelo menos para a mente. Aqueles críticos segundos de troca de marcha, leitura de placa são apagados de sua noção de passagem do tempo.
Quando você começa a repetir algo exatamente igual, a mente apaga a experiência repetida.
Conforme envelhecemos as coisas começam a se repetir - as mesmas ruas, pessoas, problemas, desafios, programas de televisão, reclamações, -.... Enfim... As experiências novas (aquelas que fazem a mente parar e pensar de verdade, fazendo com que seu dia pareça ter sido longo e cheio de novidades), vão diminuindo.
Até que tanta coisa se repete que fica difícil dizer o que tivemos de novidade na semana, no ano ou, para algumas pessoas, na década.
Em outras palavras, o que faz o tempo parecer que acelera é a... ROTINA!
A rotina é essencial para a vida e aperfeiçoa muita coisa, mas a maioria das pessoas ama tanto a rotina que, ao longo da vida, seu diário acaba sendo um livro de um só capítulo, repetido todos os anos.
Felizmente há um antídoto para a aceleração do tempo: M & M (Mude e Marque).
- Mude, fazendo algo diferente e marque, fazendo um ritual, uma festa ou registros com fotos.
- Mude de paisagem, tire férias com a família (sugiro que você tire férias sempre e, preferencialmente, para um lugar quente, um ano, e frio no seguinte) e marque com fotos, cartões postais e cartas.
- Tenha filhos (eles destroem a rotina) e sempre faça festas para eles, e para você (marcando o evento e diferenciando o dia).
- Use e abuse dos rituais para tornar momentos especiais diferentes de momentos usuais.
- Faça festas de noivado, casamento, bodas disso ou daquilo, bota-foras, participe do aniversário de formatura de sua turma, visite parentes distantes, entre na universidade com 60 anos, troque a cor do cabelo, deixe a barba, tire a barba, compre enfeites diferentes para sua casa, vá a shows, cozinhe uma receita nova, tirada de um livro novo.
- Escolha roupas diferentes, não pinte a casa da mesma cor, faça diferente.
- Beije diferente sua paixão e viva com ela momentos diferentes.
- Vá a mercados diferentes, leia livros diferentes, busque experiências diferentes.
Seja diferente!
Se você tiver dinheiro, especialmente se já estiver aposentado, vá com seu marido, esposa ou amigo para outras cidades ou países veja outras culturas, visite museus estranhos, deguste pratos esquisitos... Em outras palavras... V-I-V-A!
Porque se você viver intensamente as diferenças, o tempo vai parecer mais longo.
E se tiver a sorte de estar casado (a) com alguém disposto (a) a viver e buscar coisas diferentes, seu livro será muito mais longo, muito mais interessante e muito mais v-i-v-o... Do que a maioria dos livros da vida que existem por aí.
Cerque-se de parentes e amigos.
Parentes e amigos com gostos diferentes, vindos de lugares diferentes, e que gostam de comidas diferentes.
Enfim, acho que você já entendeu o recado, não é?
Felicidades em suas experiências para expandir seu tempo, com qualidade, emoção, rituais e vida.
E S CR EVA em tAmaNhos diFeRenTes e em CorES difErEntEs!
CRIE, RECORTE, PINTE, RASGUE, MOLHE, DOBRE, PICOTE, INVENTE, REINVENTE... V I V A!
Com amor e carinho,
Sílvia
O Jogo do Bocejo
Melhores lances, Carlos Queiroz atirando o paletó no chão e a briga entre Pepe e Felipe Melo - este foi bem retirado por Dunga por total falta de controle emocional.
No final, se o tatuado Meirelles fosse canhoto, Portugal teria ganho.
Do amor e outras histórias
À senhora Aurora devo-lhe a primeira imagem do muitíssimo - 7/8 anos de gente e a afirmação dela “o meu pessegueiro este ano tem triliões de pêssegos!” Triliões, era muito mais do que eu conseguia imaginar, muito e tanto. Ainda hoje, quando o espanto, perante o imenso me atinge, à memória chegam-me triliões de pêssegos dourados pendurados numa árvore anónima que nem cheguei a conhecer, mas que num Verão se permitiu a tal ousadia. A senhora Aurora que já nesse tempo usava os saltos mais altos de toda a freguesia, elevando 70 e muitos anos de gente uns centímetros mais acima, continua a usa-los passados todos estes anos para mim e para ela. Já não a via há muito, já nada lhe sabia há muito. Soube-a esta semana, quando alguém me sussurrou a morte perante o meu espanto. O senhor Carlos, o senhor Carlos que fazia madeira a partir das árvores e coisas a partir da madeira, morreu num susto um deste dias. Deixou a Aurora suspensa nos seus saltos e órfã de porto de escuta. Nunca o ouvi falar, porque ela falava por ele e para ele. Anos, anos, anos e agora que ele morreu e ela não tem com quem falar, fala com quem sempre falou, com ele. A dona Aurora, três da tarde de um tórrido dia de Verão, enfia os saltos pelos paralelos e chega ao cemitério. Fala-lhe: “oh Carlos tens tanta terra aí por cima de ti; oh Carlos e quando chove?; oh Carlos desculpa que eu ás vezes era tão chata; oh Carlos tu estás bem?”. Olho-a de longe com um sorriso que subitamente se quebra em água.
Olho-a e sei o Carlos longe, tão longe como triliões de pêssegos dourados, onde talvez lhe chegue a voz dela, num sussurro de que afinal, ele sempre precisou para viver- aqui ou lá. Ela há-de voltar a casa, tropeçando os oitenta e muitos anos nos paralelos da aldeia e falando para ele, como o fez toda a vida, porque em algum lugar ele vive.
Olho-a e sei o Carlos longe, tão longe como triliões de pêssegos dourados, onde talvez lhe chegue a voz dela, num sussurro de que afinal, ele sempre precisou para viver- aqui ou lá. Ela há-de voltar a casa, tropeçando os oitenta e muitos anos nos paralelos da aldeia e falando para ele, como o fez toda a vida, porque em algum lugar ele vive.
Sempre há porquês...
Se andei um pouco sumida, foi assim,
porque esta semana o trabalho quase me engoliu,
porque o que se move dentro de mim estava um pouco fora do prumo,
porque a partida de Saramago me deixou mesmo muda,
porque o inverno chegou e trouxe um pouco de uma nevasca distante (no tempo),
porque queria silêncio e colo,
porque tive muito grito e pouco aconchego,
porque meus olhos queriam descanso e o sono fugia,
porque meu corpo queria a entrega e ela não vinha,
porque as folhas vermelhas pelo chão trazem dor e alegria de mãos dadas,
porque o meu guarda-roupa está um pouco mais vazio,
porque o meu coração está mais aberto, embora protegido atrás da vidraça,
porque os desencontros me tiram lascas, mas os encontros me fazem florescer,
porque apesar de tudo o que eu falo, há muito que nunca soube dizer,
porque a casa das palavras estava vazia
mas a das sensações foi invadida...
porque esta semana o trabalho quase me engoliu,
porque o que se move dentro de mim estava um pouco fora do prumo,
porque a partida de Saramago me deixou mesmo muda,
porque o inverno chegou e trouxe um pouco de uma nevasca distante (no tempo),
porque queria silêncio e colo,
porque tive muito grito e pouco aconchego,
porque meus olhos queriam descanso e o sono fugia,
porque meu corpo queria a entrega e ela não vinha,
porque as folhas vermelhas pelo chão trazem dor e alegria de mãos dadas,
porque o meu guarda-roupa está um pouco mais vazio,
porque o meu coração está mais aberto, embora protegido atrás da vidraça,
porque os desencontros me tiram lascas, mas os encontros me fazem florescer,
porque apesar de tudo o que eu falo, há muito que nunca soube dizer,
porque a casa das palavras estava vazia
mas a das sensações foi invadida...
[Andrea de Godoy Neto]
postagem publicada também no blog: Olhar em Versos e Inversos
**********************
(meu post de apresentação é mesmo um pedido de desculpas pela ausência, ou melhor, pela demora em estrear por aqui, onde fui tão bem recebida...mas, já já eu volto ao ritmo e trago contribuições diversas)
Feliz Aniversário!
MFC, definição definitiva de aniversário: qual seria a sua idade se você não soubesse quantos anos você tem?
Parabéns, muitas alegrias e muita saúde!!
quinta-feira, 24 de junho de 2010
FERA
O dia amanhecia tímido
Farrapos translúcidos na neblina
As aves, ainda ausentes de voos
Aquietavam-se nos ramos húmidos.
Um homem espreguiçava sonhos
Lentamente acordou nas tarefas matinais.
Assomou à porta
À orla da floresta.
GED
Farrapos translúcidos na neblina
As aves, ainda ausentes de voos
Aquietavam-se nos ramos húmidos.
Um homem espreguiçava sonhos
Lentamente acordou nas tarefas matinais.
Assomou à porta
À orla da floresta.
GED
REDUTO FINAL
Dispo-me
De todas as impurezas
Até só restar
Um punho fechado no peito.
Um pequeno pássaro azul.
Pelo caminho deixei
Almas desatentas
Invejas alucinadas
Problemas supérfluos.
Abandonei encruzilhadas
Reneguei amarguras
E outras solidões.
Sou finalmente GED.
GED
De todas as impurezas
Até só restar
Um punho fechado no peito.
Um pequeno pássaro azul.
Pelo caminho deixei
Almas desatentas
Invejas alucinadas
Problemas supérfluos.
Abandonei encruzilhadas
Reneguei amarguras
E outras solidões.
Sou finalmente GED.
GED
COMANDANTE
Ausente
Para sempre
Presente
Estrela cintilante
Raio de luz
Camarada
Comandante
Companheiro
Flor do Caribe
Condor
Do altiplano boliviano
Timoneiro
Guia
Leão africano
Orgulho da nossa geração
Poeta
Guerrilheiro
Irmão
A vida inteira
Alegria
Sofrimento
Caminheiro
De caminhos certos
Pegada
Miragem
Pó
Dos grandes desertos
Solidão
Tristeza
Dor
Uma lágrima no chão
Ausente
Para sempre
Presente
Eternamente
Che
GED
Para sempre
Presente
Estrela cintilante
Raio de luz
Camarada
Comandante
Companheiro
Flor do Caribe
Condor
Do altiplano boliviano
Timoneiro
Guia
Leão africano
Orgulho da nossa geração
Poeta
Guerrilheiro
Irmão
A vida inteira
Alegria
Sofrimento
Caminheiro
De caminhos certos
Pegada
Miragem
Pó
Dos grandes desertos
Solidão
Tristeza
Dor
Uma lágrima no chão
Ausente
Para sempre
Presente
Eternamente
Che
GED
O tempo
O tempo consome a pele, o exterior, mas vai refinando o interior, as atitudes. Esfria as paixões, mas aquece o perdão e as relações com os outros e com o ambiente.
Tudo tem o bom e o mau, o feio e o bonito, o positivo e o negativo.
Quem corre atrás do tempo cansa-se, quem o espera perde-se. O tempo deve ser acarinhado a cada momento, como quem acarinha um amante, um ser querido. Porque ele faz-nos velhos mas melhores, mais sábios e prontos para outros sabores...
Enviado do meu BlackBerry® da tmn
Tudo tem o bom e o mau, o feio e o bonito, o positivo e o negativo.
Quem corre atrás do tempo cansa-se, quem o espera perde-se. O tempo deve ser acarinhado a cada momento, como quem acarinha um amante, um ser querido. Porque ele faz-nos velhos mas melhores, mais sábios e prontos para outros sabores...
Enviado do meu BlackBerry® da tmn
TU
Vem cá, deixa eu te dizer. Tu me encantas. A cada atitude ou palavra que consigo decifrar. Ou a cada reação inesperada. Tenho sede de te desvendar. E intimamente desejo que eu nunca termine de te descobrir. Porque tens o infinito em ti. Tens todos os elementos ao mesmo tempo, és um misto de tudo o que existe. E em ti quero me perder, porque sou fascinada por essas coisas indefiníveis. Nunca desejei perfeição ou autocontrole. Prefiro reações exacerbadas a existências medíocres. Adoro tudo o que é intenso, o que ao mesmo tempo faz doer e cura. Adoro. A fúria das tuas emoções. Não vives à margem dos sentimentos: te entregas, e neles mergulhas de cabeça.
Funeral blues
De W.H. Auden:
Que parem os relógios, cale o telefone,
jogue-se ao cão um osso e que não ladre mais,
que emudeça o piano e que o tambor sancione
a vinda do caixão com seu cortejo atrás.
Que os aviões, gemendo acima em alvoroço,
escrevam contra o céu o anúncio: ele morreu.
Que as pombas guardem luto — um laço no pescoço —
e os guardas usem finas luvas cor-de-breu.
Era meu norte, sul, meu leste, oeste, enquanto
viveu, meus dias úteis, meu fim-de-semana,
meu meio-dia, meia-noite, fala e canto;
quem julgue o amor eterno, como eu fiz, se engana.
É hora de apagar estrelas — são molestas —
guardar a lua, desmontar o sol brilhante,
de despejar o mar, jogar fora as florestas,
pois nada mais há de dar certo doravante.
quarta-feira, 23 de junho de 2010
Profundamente
Sempre achei tão tristes esses versos de Bandeira, mesmo não tendo noção, quando os li a primeira vez - porque era menina - da saudade enorme que marcava a voz do poeta. Tempo passou, muitos se foram dos São Jões do passado, hoje eu sei dessa saudade.
(Manuel Bandeira)Quando ontem adormeci
Na noite de São João
Havia alegria e rumor
Estrondos de bombas luzes de Bengala
Vozes, cantigas e risos
Ao pé das fogueiras acesas.
No meio da noite despertei
Não ouvi mais vozes nem risos
Apenas balões
Passavam, errantes
Silenciosamente
Apenas de vez em quando
O ruído de um bonde
Cortava o silêncio
Como um túnel.
Onde estavam os que há pouco
Dançavam
Cantavam
E riam
Ao pé das fogueiras acesas?
— Estavam todos dormindo
Estavam todos deitados
Dormindo
Profundamente.
Quando eu tinha seis anos
Não pude ver o fim da festa de São João
Porque adormeci
Hoje não ouço mais as vozes daquele tempo
Minha avó
Meu avô
Totônio Rodrigues
Tomásia
Rosa
Onde estão todos eles?
— Estão todos dormindo
Estão todos deitados
Dormindo
Profundamente.
UM DIA...
Muitas vezes dou comigo a pensar
Que há um tempo certo de morrer
Um dia a cidade vai estar vazia
O meu bando voou para lá das cordilheiras
Sobram fantasmas de amores e desamores
A minha vista cansada
Já não atinge as montanhas distantes
As cabaças de kissangua estarão secas
Os girassóis na planície já não dançarão
Rios velhos sulcam-me a face
Terei de caminhar sózinho
Muitas vezes dou comigo a pensar
Que há um tempo errado de viver.
GED
Que há um tempo certo de morrer
Um dia a cidade vai estar vazia
O meu bando voou para lá das cordilheiras
Sobram fantasmas de amores e desamores
A minha vista cansada
Já não atinge as montanhas distantes
As cabaças de kissangua estarão secas
Os girassóis na planície já não dançarão
Rios velhos sulcam-me a face
Terei de caminhar sózinho
Muitas vezes dou comigo a pensar
Que há um tempo errado de viver.
GED
A PALAVRA
Gotas de chuva escorrem na vidraça embaciada
Ouvem-se murmúrios na casa da poesia
Apenas murmúrios, quase impossível tecer a palavra
Certeira, definitiva, redonda, afiada
Quando nasce, vem do fundo mais fundo
E cresce, até me sentir esgotado
Basta acariciá-la e lançá-la no espaço
Vai voar, um voo perfeito, profundo
E pousar serena
No poema finalmente acabado.
GED
Ouvem-se murmúrios na casa da poesia
Apenas murmúrios, quase impossível tecer a palavra
Certeira, definitiva, redonda, afiada
Quando nasce, vem do fundo mais fundo
E cresce, até me sentir esgotado
Basta acariciá-la e lançá-la no espaço
Vai voar, um voo perfeito, profundo
E pousar serena
No poema finalmente acabado.
GED
terça-feira, 22 de junho de 2010
Te joga
Carioquíssima da gema, não havia situação que Shirley Anne não tirasse de letra. Conhecia a alma humana como poucos, e usava seus conhecimentos psicanalíticos para resolver até as mais singelas situações do dia a dia. Nem as noites de lei seca a impediam de se encontrar com os amigos e tomar quantas caipiroscas lhe apetecesse por medo de ter sua carteira de motorista apreendida. Quando avistava uma blitz policial, imediatamente reduzia a velocidade, acendia a luz interna, abria o vidro e cumprimentava os guardas dizendo: - Parabéns pela campanha, isso está reduzindo em muito o número de acidentes. Fico bem mais tranqüila quando minha filha sai de casa à noite. Dito isso dava seu sorriso, e seguia em frente.
Xica havia saído à mãe. Era bronzeada, usava cabelos longos, roupas coloridas, cuidadosamente escolhidas em lojas conhecidas somente por quem sabe, e acessórios retrôs comprados em brechós do Rio, Paris e Nova Iorque. Tinha a displicência dos bem nascidos, uma generosidade e uma educação rara. Figurinha manjada nas estréias teatrais, lançamentos de livros, e desfiles de moda, era também presente em badaladas Raves situadas no cais do porto ou em Vargem Grande. Publicitária, tomou-se de encantos por um colega de trabalho, que sonhava ser ator, e em pouco tempo estavam íntimos, com uma cumplicidade que deixava a todos enciumados, inclusive seu noivo. Falava nele o tempo todo: - Carlito disse isso; - Carlito fez aquilo; - Carlito é que sabe; - Tadinho do Carlito; - Perseguem o Carlito; - Demitiram o Carlito; - O que fazer para ajudar o Carlito?
Desempregado, a situação do Carlito foi piorando. Em apenas três meses seus míseros tostões foram consumidos, e o pessoal da república de artistas gentilmente pediu que ele cedesse seu espaço para um outro aspirante a ator que podia pagar o aluguel. O pobre Carlito estava desesperado. Começou a falar que não valia a pena viver, que não via saída, que o seu fim era próximo. Sua única razão de viver era a estréia de sua primeira peça teatral prevista para ocorrer em três meses. Ele havia transformado em monólogo, uma peça teatral escrita para vários personagens. Coisa de gênio, Xica e Carlito confidenciavam para os amigos. Uma pena é que ela iria estrear em um teatro pequeno de Copacabana, e a renda prevista não seria muito grande. Mas esse era apenas o começo. Logo ele ficaria conhecido, entraria para a Globo, e o céu seria o limite. Xica ficou penalisadíssima quando escutou do próprio Carlito, aos prantos, que ele havia sido despejado da república, e que como seus pais eram pobres, moravam no interior de Minas, teria que voltar para Barbacena por uns tempos, adiando seu projeto de vida. Aflita, falou que ele poderia ficar em sua casa por uma semana. Que nesse tempo ele encontraria uma solução, um lugar barato para ficar. Ele poderia fazer uns bicos enquanto isso como garçon ou em lojas, afinal o Natal se aproximava e as lojas e restaurantes estavam contratando. Envergonhado, Carlito recusou o convite, agradeceu o carinho, ponderou que o noivo de Xica não gostava dele, mas acabou ficando. Embora pequeno, o apartamento da Xica era em Ipanema, próximo ao mar, contava com dois quartos, uma sala com sacada, e como se isso já não fosse o máximo, ainda tinha uma vista para o Corcovado. Carlito se acostumou rapidamente. E não ficou apenas por uma semana. Ficou por duas, por três, por um mês, dois meses e mais. Já a Xica, ela foi ficando é de saco cheio mas, como tinha bom coração, não sabia como despejar o amigo. Que situação. Até a mãe de Xica simpatizava com o rapaz. Ele havia mexido com seu lado maternal. O casamento de Xica estava próximo, e então combinaram que ele poderia ficar até o final do mês, pois o apartamento entraria em obras, e ele teria que sair para dar espaço para os móveis e roupas do noivo. No dia combinado, Carlito pediu para somente sair depois que a amiga já houvesse ido para o trabalho, porque era muito sentimental e detestava despedidas. Além disso, eles continuariam a se falar todos os dias. Não havia razão para melodramas e choradeiras. Apenas se deram dois beijinhos e tchau amor. À noitinha, Xica chegou em casa feliz. Finalmente só, poderia transitar com seu noivo livremente, sem ninguém para incomodar. Abriu uma cerveja, sentou na rede, e acabou por adormecer. Ao acordar, decidiu tomar um banho e colocar uma roupa mais confortável. Encheu a banheira de sais e espumas, e ficou lá uma hora relaxando. Que banho gostoso. Depois, dirigiu-se ao seu quarto para vestir algo confortável. Mas que surpresa. Seu armário estava vazio. Apenas sobraram as sandálias, os tênis e os sapatos. Até os chinelos e tamancos haviam desaparecido. Seus vestidos, chapéus, colares, acessórios, camisolas e roupas íntimas haviam simplesmente partido com o Carlito. Ligou para Carlito várias vezes, mas ele não atendeu. Procurou pelos amigos em comum, mas ninguém sabia do rapaz. Não é possível. Carlito jamais faria isso com ela. Que decepção com o gênero humano. Seu melhor amigo vender suas roupas para faturar uns trocados. Isso seria muita baixaria. Furiosa, foi ao teatro e soube que ele não aparecia por lá há dois meses. Ele sumira misteriosamente, sem deixar vestígios. Recuperada do baque, Xica casou, foi para Nova Iorque em lua de mel, comprou novas roupas e seguiu sua vida. Na volta, soube por um conhecido que Carlito morava na Glória e estava preparando sua estréia teatral finalmente. Movida por uma profunda ira, foi ao endereço de Carlito que, com medo do escândalo e da polícia (ela ameaçava dar queixa), permitiu sua entrada. Ele confessou que sua atitude fora impensada. Que não havia lhe roubado em razão do dinheiro ou intencionalmentte. O motivo é que ele estava apaixonado pelas roupas. Como ele não tinha o que fazer, um dia experimentara por brincadeira um vestido, depois um colar, um chapéu e uma pulseira. Isso se tornou uma compulsão, e logo ele começou a curtir sua langerie, roupa íntima, tamancos e sandálias. Xica ficou chocada, disse que ele estava doente, que não sabia o que fazer e foi embora. Procurou imediatamente sua mãe que, após fazer a análise psicológica do caso, chegou a conclusão que, mesmo assim, isso fora uma tremenda maldade. Insandecida de ódio, Shirley Anne ligou para o rapaz e disse: - Carlito, aqui é a Shirley Anne. A Shirley é uma psicanalista boazinha, mas a Anne é uma mãe enlouquecida. Carlito, sobe no telhado e te joga. Te joga Carlito! Se você não se jogar eu vou aí e te jogo.
Carlito pediu desculpas, desligou o telefone, decidiu deixar o tempo rolar e a zanga da Anne passar. Na noite seguinte, Shirley Anne foi jantar com amigos, pediu umas caipiroscas, e contou para todos o caso. Como havia outros psicanalistas, foram diversos os interpretaços. Na volta, Shirley Anne avistou uma blitz, acendeu a luz, abriu o vidro, sorriu, deu parabéns, e foi parada. Como recusou-se a fazer o teste do bafômetro, perdeu sua carteira de motorista por um ano. Que raiva do Carlito.
Xica havia saído à mãe. Era bronzeada, usava cabelos longos, roupas coloridas, cuidadosamente escolhidas em lojas conhecidas somente por quem sabe, e acessórios retrôs comprados em brechós do Rio, Paris e Nova Iorque. Tinha a displicência dos bem nascidos, uma generosidade e uma educação rara. Figurinha manjada nas estréias teatrais, lançamentos de livros, e desfiles de moda, era também presente em badaladas Raves situadas no cais do porto ou em Vargem Grande. Publicitária, tomou-se de encantos por um colega de trabalho, que sonhava ser ator, e em pouco tempo estavam íntimos, com uma cumplicidade que deixava a todos enciumados, inclusive seu noivo. Falava nele o tempo todo: - Carlito disse isso; - Carlito fez aquilo; - Carlito é que sabe; - Tadinho do Carlito; - Perseguem o Carlito; - Demitiram o Carlito; - O que fazer para ajudar o Carlito?
Desempregado, a situação do Carlito foi piorando. Em apenas três meses seus míseros tostões foram consumidos, e o pessoal da república de artistas gentilmente pediu que ele cedesse seu espaço para um outro aspirante a ator que podia pagar o aluguel. O pobre Carlito estava desesperado. Começou a falar que não valia a pena viver, que não via saída, que o seu fim era próximo. Sua única razão de viver era a estréia de sua primeira peça teatral prevista para ocorrer em três meses. Ele havia transformado em monólogo, uma peça teatral escrita para vários personagens. Coisa de gênio, Xica e Carlito confidenciavam para os amigos. Uma pena é que ela iria estrear em um teatro pequeno de Copacabana, e a renda prevista não seria muito grande. Mas esse era apenas o começo. Logo ele ficaria conhecido, entraria para a Globo, e o céu seria o limite. Xica ficou penalisadíssima quando escutou do próprio Carlito, aos prantos, que ele havia sido despejado da república, e que como seus pais eram pobres, moravam no interior de Minas, teria que voltar para Barbacena por uns tempos, adiando seu projeto de vida. Aflita, falou que ele poderia ficar em sua casa por uma semana. Que nesse tempo ele encontraria uma solução, um lugar barato para ficar. Ele poderia fazer uns bicos enquanto isso como garçon ou em lojas, afinal o Natal se aproximava e as lojas e restaurantes estavam contratando. Envergonhado, Carlito recusou o convite, agradeceu o carinho, ponderou que o noivo de Xica não gostava dele, mas acabou ficando. Embora pequeno, o apartamento da Xica era em Ipanema, próximo ao mar, contava com dois quartos, uma sala com sacada, e como se isso já não fosse o máximo, ainda tinha uma vista para o Corcovado. Carlito se acostumou rapidamente. E não ficou apenas por uma semana. Ficou por duas, por três, por um mês, dois meses e mais. Já a Xica, ela foi ficando é de saco cheio mas, como tinha bom coração, não sabia como despejar o amigo. Que situação. Até a mãe de Xica simpatizava com o rapaz. Ele havia mexido com seu lado maternal. O casamento de Xica estava próximo, e então combinaram que ele poderia ficar até o final do mês, pois o apartamento entraria em obras, e ele teria que sair para dar espaço para os móveis e roupas do noivo. No dia combinado, Carlito pediu para somente sair depois que a amiga já houvesse ido para o trabalho, porque era muito sentimental e detestava despedidas. Além disso, eles continuariam a se falar todos os dias. Não havia razão para melodramas e choradeiras. Apenas se deram dois beijinhos e tchau amor. À noitinha, Xica chegou em casa feliz. Finalmente só, poderia transitar com seu noivo livremente, sem ninguém para incomodar. Abriu uma cerveja, sentou na rede, e acabou por adormecer. Ao acordar, decidiu tomar um banho e colocar uma roupa mais confortável. Encheu a banheira de sais e espumas, e ficou lá uma hora relaxando. Que banho gostoso. Depois, dirigiu-se ao seu quarto para vestir algo confortável. Mas que surpresa. Seu armário estava vazio. Apenas sobraram as sandálias, os tênis e os sapatos. Até os chinelos e tamancos haviam desaparecido. Seus vestidos, chapéus, colares, acessórios, camisolas e roupas íntimas haviam simplesmente partido com o Carlito. Ligou para Carlito várias vezes, mas ele não atendeu. Procurou pelos amigos em comum, mas ninguém sabia do rapaz. Não é possível. Carlito jamais faria isso com ela. Que decepção com o gênero humano. Seu melhor amigo vender suas roupas para faturar uns trocados. Isso seria muita baixaria. Furiosa, foi ao teatro e soube que ele não aparecia por lá há dois meses. Ele sumira misteriosamente, sem deixar vestígios. Recuperada do baque, Xica casou, foi para Nova Iorque em lua de mel, comprou novas roupas e seguiu sua vida. Na volta, soube por um conhecido que Carlito morava na Glória e estava preparando sua estréia teatral finalmente. Movida por uma profunda ira, foi ao endereço de Carlito que, com medo do escândalo e da polícia (ela ameaçava dar queixa), permitiu sua entrada. Ele confessou que sua atitude fora impensada. Que não havia lhe roubado em razão do dinheiro ou intencionalmentte. O motivo é que ele estava apaixonado pelas roupas. Como ele não tinha o que fazer, um dia experimentara por brincadeira um vestido, depois um colar, um chapéu e uma pulseira. Isso se tornou uma compulsão, e logo ele começou a curtir sua langerie, roupa íntima, tamancos e sandálias. Xica ficou chocada, disse que ele estava doente, que não sabia o que fazer e foi embora. Procurou imediatamente sua mãe que, após fazer a análise psicológica do caso, chegou a conclusão que, mesmo assim, isso fora uma tremenda maldade. Insandecida de ódio, Shirley Anne ligou para o rapaz e disse: - Carlito, aqui é a Shirley Anne. A Shirley é uma psicanalista boazinha, mas a Anne é uma mãe enlouquecida. Carlito, sobe no telhado e te joga. Te joga Carlito! Se você não se jogar eu vou aí e te jogo.
Carlito pediu desculpas, desligou o telefone, decidiu deixar o tempo rolar e a zanga da Anne passar. Na noite seguinte, Shirley Anne foi jantar com amigos, pediu umas caipiroscas, e contou para todos o caso. Como havia outros psicanalistas, foram diversos os interpretaços. Na volta, Shirley Anne avistou uma blitz, acendeu a luz, abriu o vidro, sorriu, deu parabéns, e foi parada. Como recusou-se a fazer o teste do bafômetro, perdeu sua carteira de motorista por um ano. Que raiva do Carlito.
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